Homilia de 03 de setembro, publicada no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 37 de 10 de setembro de 2015
Só quem é humilde e sabe reconhecer a sua condição de pecador é capaz de se deixar encontrar verdadeiramente pelo Senhor. As características do encontro pessoal com Jesus foram o centro da reflexão do Papa.
Para a sua homilia, o Pontífice inspirou-se no Evangelho do dia, de Lucas (5, 1-11) no qual Pedro é convidado a lançar as redes não obstante uma noitada de pesca inconcludente. “É a primeira vez que acontece este fato, esta pesca milagrosa. Mas depois da ressurreição haverá outra, com características que se assemelham”, observou. E diante do gesto de Simão Pedro que se lança aos joelhos de Jesus, dizendo: “Senhor, afasta-te de mim, porque sou um pecador”, Francisco deu início a uma meditação sobre o modo como “Jesus se encontrava com as pessoas e como as pessoas se encontravam com Jesus”.
Antes de tudo, Jesus ia pelas ruas, passava “a maior parte do seu tempo pelas ruas, com as pessoas; depois, no final da tarde retirava-se para rezar sozinho”. Portanto, ele “encontrava-se com as pessoas”, procurava-as. Mas as pessoas, questionou-se o Papa, de que modo se encontravam com Jesus? Substancialmente de “duas maneiras”. Uma é a que se observa em Pedro e que é a mesma “do povo”. O Evangelho, frisou o Pontífice, “usa a mesma palavra para as pessoas, para o povo, para os apóstolos, para Pedro”: isto é, que eles, ao encontrar-se com Jesus, “permaneceram ‘maravilhados’ “. Pedro, os apóstolos, o povo, manifestam “este sentimento de admiração” e dizem: “Mas, ele fala com autoridade”.
Ao contrário, nos evangelhos lê-se sobre “outro grupo que se encontrava com Jesus” mas que “não deixava que a admiração entrasse no seu coração”. São os doutores da lei, os quais ouviam Jesus e emitiam os próprios julgamentos: “É inteligente, é um homem que diz coisas verdadeiras, mas a nós não nos convêm essas coisas”. Praticamente, “distanciavam-se”. E depois havia outros “que ouviam Jesus” e eram os “demônios”, como se deduz também do trecho evangélico da liturgia de quarta-feira 2, onde está escrito que Jesus “impondo as mãos sobre cada um, curava-os, de muitos saíam até demônios, gritando: ‘Tu és o Filho de Deus’ “. Explicou o Papa: “Tanto os demônios, quanto os doutores da lei, os fariseus malvados, não tinham a capacidade de se admirar, estavam fechados na sua suficiência, na sua soberba”.
Ao contrário o povo e Pedro possuía essa capacidade. “Qual é a diferença?”, perguntou Francisco. De fato, argumentou Pedro, “confessa” o que confessam os demônios. “Quando Jesus em Cesareia de Filipe pergunta: ‘Quem sou?’ “ e ele responde: “Tu és o filho de Deus, és o Messias”, Pedro “faz a confissão, diz quem é ele”. E também os demônios fazem o mesmo, reconhecendo que Jesus é o filho de Deus. Mas Pedro acrescenta “outra coisa que os demônios não dizem”. Isto é, fala de si mesmo e diz: “Afasta-te de mim, Senhor, porque sou um pecador”. Nem os fariseus, nem os doutores da lei, nem os demônios “podem dizer isto”, não conseguem. “Os demônios — explicou Francisco — chegam a dizer a verdade sobre Jesus, mas não sobre eles mesmos” porque “a soberba é tão grande que os impede de o fazer”.
Também os doutores da lei reconhecem: “Mas este homem é inteligente, é um rabino competente, faz milagres”. Mas não são capazes de acrescentar: “Somos soberbos, não somos suficientes, somos pecadores”.
Eis então o ensinamento que é válido para cada um: “A incapacidade de nos reconhecermos pecadores afasta-nos da verdadeira confissão de Jesus Cristo”. Esta é justamente “a diferença”. O próprio Jesus faz com que a entendamos “naquela bonita parábola do publicano e do fariseu no templo”, na qual se constata “a soberba do fariseu diante do altar”. O homem fala bem de si mesmo, mas nunca diz: “Sou pecador, errei”. Diante dele contrapõe-se “a humildade do publicano que não ousa erguer os olhos” e diz somente: “Piedade, Senhor, sou pecador”. E é exatamente “esta capacidade de dizer que somos pecadores” que nos abre “à admiração do encontro com Jesus Cristo, o encontro verdadeiro”.
Neste ponto, o Papa observou a realidade atual: “Também nas nossas paróquias, nas nossas sociedades, entre as pessoas consagradas: quantos são capazes de dizer que Jesus é o Senhor? Muitos!”. Mas é difícil ouvir “dizer sinceramente: ‘Sou um pecador, uma pecadora’ “. Provavelmente, frisou, “é mais fácil dizer isso dos outros, quando fazemos fofoca”. E frisou Francisco: nisto “todos somos doutores”.
Mas “para chegar a um encontro verdadeiro com Jesus é necessária a dupla confissão: ‘Tu és o Filho de Deus e eu sou um pecador’ “. “Não em teoria”: devemos ser honestos conosco, capazes de indicar os nossos erros e admitir: sou pecador “por esta razão...”.
Voltando à vicissitude evangélica, o Pontífice recordou que Pedro em seguida talvez tenha “esquecido a admiração do encontro”, a admiração que tivera quando Jesus lhe disse: “Tu és Simão, filho de Jonas, mas chamar-te-ei Pedro”. A ponto que um dia o próprio Pedro “que fez esta confissão dupla” negou o Senhor. Contudo, sendo “humilde”, deixa também “que o Senhor o encontre e quando os seus olhares se cruzam, ele chora, volta à confissão: ‘Sou pecador’ “.
À luz de tudo isto o desejo final do Papa Francisco: “O Senhor nos conceda a graça de o encontrarmos mas também de nos deixarmos encontrar por Ele”. A graça “tão bonita” da “admiração do encontro”, mas também “a graça de fazer a dupla confissão na nossa vida: ‘Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo, creio. E eu sou um pecador, creio’ “.
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