Homilia de 14 de setembro, publicada no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 38 de 17 de setembro de 2015
Para contemplar Jesus na cruz não é necessário deter-nos diante das pinturas até muito bonitas, mas que contudo não representam a dura realidade daquele suplício dilacerante. Sugeriu o Papa, evocando a imagem da “serpente feia” para tornar ainda mais viva e incisiva a meditação. A ponto que precisamente a cruz e a serpente estiveram no centro da homilia da missa de segunda-feira, na qual participaram os cardeais conselheiros.
“Parece que o protagonista destas leituras de hoje é a serpente e aqui há uma mensagem”, realçou de fato Francisco. Sim “há uma profunda profecia nesta apresentação da serpente” que, explicou, “foi o primeiro animal a ser apresentado ao homem, o primeiro sobre o qual se fala na Bíblia”, com a definição de “mais astuto entre os animais selvagens que o Senhor tinha criado”. E “a figura da serpente não é bonita, causa sempre medo”: não obstante “a pele da serpente seja bonita”, permanece o fato de que a serpente tem uma atitude que assusta”.
O Gênesis, afirmou o Papa, “diz que é “a mais astuta”“ mas também que “é uma encantadora e tem a capacidade de seduzir, de nos fascinar. Mais ainda: “é uma mentirosa, é uma invejosa porque devido à inveja do diabo, da serpente, o pecado entrou no mundo”. Mas “tem esta capacidade da sedução para nos arruinar: promete-te muitas coisas, mas na hora de pagar paga mal, é uma má pagadora”. Porém, frisou o Pontífice, a serpente “possui esta capacidade de seduzir, de encantar”. Paulo, por exemplo, “irrita-se com os cristãos de Galácia que lhe deram muito trabalho” e diz-lhes: “Estultos Gálatas, quem vos encantou? A vós que fostes chamados à liberdade, quem vos encantou?”. Quem os corrompeu foi precisamente a serpente “e esta não é uma novidade: estava na consciência do povo de Israel”.
Repropondo o trecho hodierno, tirado do livro dos Números (21, 4-9), Francisco recordou que “para salvar daquele veneno das serpentes o Senhor disse a Moisés que fizesse uma serpente de bronze: quem olhava para aquela serpente salvava-se”. E “esta é uma figura, uma profecia, uma promessa: uma promessa não fácil de compreender”. O Evangelho de hoje (Jo 3, 13-17) narra-nos também que “o próprio Jesus explica a Nicodemos um pouco mais” o gesto de Moisés: com efeito, assim como ele “exaltou a serpente no deserto, também deve ser exaltado o Filho do homem, para que quem nele acreditar tenha a vida eterna”. Em síntese, o Papa disse, “aquela serpente de bronze era uma figura de Jesus elevado na Cruz”.
Por que razão, perguntou Francisco, “o Senhor tomou como exemplo esta figura tão feia, tão má?”. Simplesmente — foi a sua resposta — “porque ele veio para carregar sobre si todos os nossos pecados”, tornando-se “o maior pecador sem ter cometido pecado algum”.
Assim Paulo narra que Jesus se fez pecado por nós: portanto, retomando a figura Cristo fez-se serpente. “É feio!”, comentou o Pontífice. Mas “Ele fez-se pecado para nos salvar: é este o significado da mensagem da liturgia da Palavra de hoje”. É exatamente “o percurso de Jesus: Deus fez-se homem e assumiu sobre si o pecado”.
Na carta aos Filipenses (2, 6-11), proposta pelas leituras de hoje, Paulo explica este mistério, também porque, realçou o Papa, gostava muito dele. “Mesmo estando na condição de Deus, Jesus não considerou um privilégio ser como Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, assumindo uma condição de servo, tornando-se semelhante aos homens; humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente até à morte, e morte de cruz”.
Por conseguinte, repetiu Francisco, “aniquilou-se a si mesmo: tornou-se pecado por nós, Ele que não conhecia o pecado”. Este, portanto, “é o mistério” e nós “podemos dizer: tornou-se uma serpente feia, que dá repulsão, por assim dizer”.
Há muitas pinturas, afirmou Francisco, que nos ajudam a contemplar “Jesus na cruz, mas a realidade é outra: era tudo deturpado, ensanguentado pelos nossos pecados”. Aliás, “este é o caminho que Ele percorreu para vencer a serpente no seu campo”. Portanto, sugeriu o Papa, é necessário “olhar sempre para a cruz de Jesus, mas não para aquelas cruzes artísticas, bem pintadas”: ao contrário, olhar “para a realidade, o que era a cruz naquele tempo”. E “olhar para o seu percurso”, recordando que “se aniquilou a si mesmo, se rebaixou para nos salvar”.
“Também este é o caminho do cristão”, continuou o Pontífice. Com efeito, “se um cristão quiser ir em frente pelo caminho da vida cristã deve rebaixar-se, como Jesus se rebaixou: é o caminho da humildade” que prevê “que se carregue sobre si as humilhações, como as carregou Jesus”. É exatamente isto, insistiu o Santo Padre, “o que a liturgia nos diz hoje nesta festa da santa Cruz”. E que o Senhor, concluiu, “nos dê a graça que pedimos a Nossa Senhora aos pés da Cruz: a graça de chorar, de chorar de amor, de chorar de gratidão porque o nosso Deus nos amou a tal ponto que enviou seu Filho para que se rebaixasse e se aniquilasse para nos salvar”.
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