Homilia de 20 de outubro, publicada no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 43 de 22 de outubro de 2015
Não temos “um Deus mesquinho” nem “um Deus parado”. O nosso é “um Deus que sai” para “procurar cada um de nós”. E quando nos encontra “nos abraça, nos beija”, porque é “um Deus que faz festa” e no céu faz-se “mais festa por um pecador que se converte” que “por uma centena de pessoas que permanecem justas”. O Pontífice voltou a falar sobre este amor “sem medida” do Pai; como de costume, Francisco inspirou-se nas leituras da liturgia, em particular no trecho da carta aos Romanos (5, 12.15.17-19.20-21) no qual são Paulo recorda que “como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim a morte passou a todo o gênero humano, porque todos pecaram... Se pelo pecado de um só homem reinou a morte (por esse único homem), muito mais aqueles que receberam a abundância da graça e o dom da justiça reinarão na vida por um só, que é Jesus Cristo!». Trata-se — frisou o Papa — de “um resumo da história da salvação”, no qual o apóstolo “nos diz como Deus salva, como nos salvou, como nos salva: como dá a salvação que é a amizade entre nós e ele”.
O Pontífice uniu este trecho ao da liturgia do dia precedente, no qual — recordou — “falamos sobre a esmola, dissemos que Deus concede sem medida: dá-se a si mesmo, o seu Filho”. Também desta vez, o discurso versa sobre “esta ideia: como Deus concede, neste caso a amizade, a salvação toda nossa?”. A resposta do Pontífice é que Deus “doa como diz que dará a nós quando fazemos uma obra boa: nos dará uma medida boa, acumulada, cheia, transbordante”. Uma generosidade que traz à mente o conceito de “abundância”. E não por acaso, observou Francisco, “esta palavra ‘abundância’ neste trecho é repetida três vezes”.
Portanto, “Deus concede na abundância”. Tanto é verdade que Paulo, como “resumo final” do seu discurso, afirma: “Onde abundou o pecado superabundou a graça”. Eis como é “o amor de Deus: desmedido. Todo ele mesmo”. De fato, recordou o Papa, “Ele enviou o seu Filho, abaixou-se para se fazer companheiro de estrada, para caminhar conosco: ele mesmo caminhou conosco, desde o início com o seu povo”.
Então o que significa “esta superabundância de se dar que é o amor de Deus?”. Significa que “Deus não é um Deus mesquinho: ele não conhece a mesquinhez, concede tudo”. Significa também que “Deus não é um Deus parado: ele observa, espera que nos convertamos”. Substancialmente, frisou o Pontífice, “Deus é um Deus que sai: sai à procura, procura cada um de nós”. Todos os dias “ele procura-nos, está à nossa procura”, como faz o pastor com a “ovelha tresmalhada” ou a mulher com a “moeda perdida”. Deus “procura: sempre e desta forma. Deus espera em ação. Nunca se cansa de nos esperar”. A sua atitude é a mesma do “pai idoso” que “ao ver de longe o filho que voltava para casa” imediatamente “correu ao seu encontro para o abraçar”. Também “Deus nos espera: sempre com as portas abertas”. Porque o seu coração “não está fechado: está sempre aberto”. E “quando chegarmos como aquele filho, nos abraçará, nos beijará: um Deus que faz festa”. Jesus “diz isto explicitamente ao falar da justificação, isto é, dos pecados perdoados: haverá mais festa no céu por um pecador que se converte que por uma centena que permanece justa”. Este “é o amor de Deus; Deus ama-nos assim, sem medida”.
Certamente, reconheceu Francisco, “não é fácil, com os nossos critérios humanos — somos pequenos, limitados — compreender o amor de Deus. Podemos entender nos gestos do Senhor esta superabundância, mas entender tudo não é fácil”. A este propósito, o Papa recordou a figura de uma religiosa que conheceu durante o seu ministério em Buenos Aires. Era “uma religiosa idosa, muito idosa, que durante toda a vida trabalhou numa enfermaria do hospital”. Tinha “mais de 84 anos” mas trabalhava “sempre com um sorriso. Com certeza sentia o amor de Deus, porque falava sempre sobre o amor de Deus e fazia sentir este amor”. Por isso “lhe tínhamos dado um apelido, chamando-lhe ‘a irmã amor-de-Deus’”. E é “uma graça”, comentou o Pontífice, “encontrar estas pessoas, estes santos, aos quais o Senhor concedeu o dom de compreender este mistério, esta superabundância do seu amor”.
Resta o fato que “nós temos sempre o hábito de medir as situações com os nossos parâmetros: e as nossas medidas são pequenas”. Por isso — recomendou Francisco — “nos fará bem pedir ao Espírito Santo a graça, rezar ao Espírito Santo, pela graça de nos aproximarmos pelo menos um pouco para compreender este amor e ter a vontade de ser abraçados, beijados, com aquela medida sem limites”. Na realidade, São Paulo “tinha entendido quanto é terrível o pecado, mas quanto é grande a superabundância do amor de Deus. A tal ponto que se sente pequeno e num certo momento, movido pelo Espírito Santo, chama Deus ‘pai’” Habitualmente “fala do Pai, o Pai”, mas “a um certo ponto diz: papá”. Portanto, afirmou o Papa, “graças ao Espírito posso dizer-lhe ‘papá’”. E convidou, concluindo: “Peçamos a graça de sentir este amor, que é um amor de pai, um grande amor, sem limites”.
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