Os problemas, as histórias pessoais, o medo de falhar. E um contexto onde se casar, agora, parece uma loucura. Porém, é possível “encontrar pessoas felizes”... Assim, dez casais de Carrara (e outros) descobriram, por contágio, a beleza do matrimônio
É manhã de domingo no bar Bukowsli, de Carrara, localizada na região italiana da Toscana, e, aqui, todos sabem que hoje é o dia do casamento de Nicolas. Os frequentadores do local ainda se lembram de quando, aos dezessete anos, acelerava sua moto, em qualquer hora, na avenida reta que atravessa a planície em direção ao mar. Era um rapaz muito inquieto, e sofria por causa da separação dos pais. É normal, hoje, se perguntar como, aos 24 anos, pôde se tornar um homem capaz de dar “o grande passo”. Em Carrara, não acontecem muitos casamentos. Nem no cartório, nem na igreja. Aqui, assim como em vários lugares, muitos casais vivem um namoro eterno ou, num determinado momento, decidem morar juntos. Talvez seja por isso que quando a esposa, Giulia, chega diante da igreja Jesus Menino, é uma festa para todo o bairro. Há pessoas que olham da sacada, outros descem de chinelos e há quem, passando de carro por ali, encosta para ver um fato singular.
Giulia e Nicolas são jovens da Casa Rossa. Foi nesta casa cor de tijolo adjacente à igreja, que os jovens se conheceram, se apaixonaram e começaram a namorar. Assim como outros seis casais que se casaram nos últimos dois anos, e outros quatro que se casarão nos próximos meses. Queremos falar sobre isso para entrar mais a fundo na beleza do matrimônio da qual fala a Exortação apostólica Amoris laetitia, do Papa Francisco.
A Casa Rossa foi um presente de padre Augusto. Quinze anos atrás foi entregue em ruínas a Carlo Santarini, médico anestesista, em torno do qual gravitavam muitos jovens da igreja onde foi catequista e, depois, educador. “No início, a reformamos como pudemos com nossas próprias mãos. Os jovens começaram a passar cada vez mais tempo ali e a convidar os companheiros”, conta Carlo, que hoje tem 61 anos de idade: “Depois da escola vínhamos aqui jogar, fazer as tarefas e muitas vezes ficávamos até o jantar. Depois, no verão, íamos acampar nas montanhas. Os jovens chegavam ali com seus dramas: as brigas dos pais, as rejeições, ele ou ela que lhe diz ‘não’. Queriam entender por que, em tudo o que acontecia, havia sempre um fogo que não se apagava”. Pacato, humilde, Carlo não dava uma resposta aos meninos, simplesmente dava a si mesmo. “Eles se apegaram a mim porque entendiam que eu também tinha o mesmo fogo e não me assustava. Ajudamo-nos apenas com uma simples regra: a oração comunitária, o encontro semanal e o fundo comum. O resto veio por si”.
Ainda hoje Carlo é o ponto incandescente deste lugar: na Casa, sempre chegavam novos grupos de jovens e, junto com Francesca, sua mulher, ajudou os jovens casais que pretendiam se casar. “Para nenhum deles foi um passo óbvio. Pelo contrário. Nós os vimos tornarem-se adultos, começarem a trabalhar, aprofundarem o caminho da fé, abraçarem a experiência de CL, mas em relação ao casamento continuavam bloqueados. Estavam juntos há anos, mas ninguém estava disposto a se lançar”, explica Francesca. Carlo se preocupava com isso. Sabia que não era a indolência que os freava, mas o medo. “Muitos deles cresceram em famílias despedaçadas e vivenciaram a amargura de seus pais, em um clima de cinismo geral. Casar-se, para eles, não era mais uma coisa natural”. Carlo intui que os jovens não podem recomeçar sem ver com os próprios olhos a experiência de alegria da qual o Papa fala em sua Exortação apostólica. Assim, de Carrara, começam a fazer uma série de convites e viagens para conhecerem outras famílias. Não em busca de um modelo perfeito, mas para entenderem como a beleza que encontramos quando jovens podia crescer no “sim” definitivo ao outro. “Era uma aposta, e dizia a mim mesmo: ‘Vamos ver se é verdade que é possível viver intensamente a vida dentro de uma família’, porque, para mim, isso sempre foi uma coisa pouco entusiasmante”, conta Marco, 31 anos, casado com Bea, de 28. “Encontrar pessoas felizes é algo irresistível, que nos contagia. Durante um ano eu e Marco íamos encontrá-los sempre que podíamos. Viajávamos 300 km para chegar para um jantar em Milão ou Bérgamo, mesmo que apenas para perguntar o que significa compartilhar”, conta Bea, que naquele período sofria pelo fato de Marco estar muito preso com o trabalho e, nos finais de semana, normalmente ocupado com os encontros do Movimento. “Eu estava com raiva porque durante anos ele tinha estado no centro de tudo e, agora, sentia os dias vazios, sem nada de meu para escolher”.
Quem responde à sua questão é Franco, casado com Grazia há mais de trinta anos: “Quando minha mulher vai ao cabeleireiro, não significa que eu também deva ir para que compartilhe com ela. Compartilhar significa que quando ela volta eu me dou conta de que está mais bonita, que é mais mulher. E que eu posso amá-la ainda mais”. Para Bea, isso é uma libertação, entende que o casamento é a restituição da grandeza para a qual fomos feitos. “Quando descobrimos que o matrimônio é um vínculo que abre, então começamos a querer apressar a cerimônia. E, em poucos meses, nos casamos”, conta Marco.
É uma companhia que os sustenta, também quando chegam as dificuldades. Pouco depois do casamento, Bea teve um aborto espontâneo. Na manhã em que se sentiu mal, Marco não foi trabalhar. “Passei o dia indo ao banheiro, a única coisa que conseguia fazer era chorar”, conta ela. Ele a observava e de vez em quando piscava para ela. Depois, de repente, lhe pergunta: “Bea, onde está nosso filho agora?”. Ela, com um fio de voz, responde: “Só posso dizer: na lixeira”. Marco não hesita: “Não, Jesus nunca brincou conosco. Pense em como cuidou de nós, pense nos amigos que nos deu”. Um ano atrás, quando Anna nasceu, olharam para ela como puro dom.
Liberdade absoluta. Frederica e Mateus também têm uma menina de 18 meses. E o casamento deles, que ninguém esperava, também tem seu início na Casa Rossa. “Cheguei quando tinha 15 anos. Tinha acabado de abandonar a escola e para minha família, eu era um derrotado”, lembra Mateus, 30 anos. Conheci Carlo que, ao contrário, me olhava com uma liberdade absoluta, eu não precisava lhe demonstrar nada. Porque ele era um homem feliz. Não tinha filhos, mas era a pessoa mais feliz que eu conhecia”. Frederica chegou à Casa Rossa mais ou menos no mesmo período: tinha 17 anos, seus pais também eram separados e cresceu na Igreja Valdense. “Ia à missa e, depois, frequentava o culto com meu pai. Carlo nunca pediu que eu mudasse, pelo contrário, esteve presente no dia da minha Confirmação”. Aos 19 anos acontece a reviravolta, quando decide se converter porque o cristianismo “não era só algo do passado para ser estudado, mas era o que me acontecia na Casa Rossa”.
Carlos e Francesca também são fundamentais na decisão dos dois de se casarem: “Olhávamos para eles e era impossível não desejar que também para nós fosse para sempre, mas estávamos indecisos”, explica Mateus. Sobretudo Frederica que, por causa da separação dos pais, sempre teve restrições em relação a isso. Francesca e Carlo os convidam para jantar. Mas não teorizam muito. Falam sobre datas e casas onde poderiam morar. No fim, antes de ir embora, Mateus pergunta a Francesca: “O que você acha: ela é a mulher da minha vida?”. Francesca responde: “Conheço você há muitos anos e nunca o vi falar assim de uma mulher. O melhor de você vibra quando diz que está disposto a acolhê-la para sempre e isso é porque vê nela aquele que a está doando a você”. Foi o suficiente para decidir.
Brigas e perdão. Sibelle e André se casaram em maio de 2014. Depois de uma indecisão louca. Ela nunca se imaginou de vestido branco e, depois, “brigava muito com André”. O que acabou com a incerteza foi ver seus amigos se casando. “Comecei a desejar a vida nova que via eles começarem. Em todas as cerimônias, pedia o mesmo para nós dois”, conta Sibille, que está se formando em Medicina.
Um dia, confessa a Carlo suas resistências. Ele a pressiona: “Você quer isso, mesmo se nada mude?”. “Naquele momento entendi que eu não queria completamente. Se queria acolhê-lo, precisava aprender a perdoar”. Hoje, Sibille e André acompanham os casais da igreja na preparação ao matrimônio: “Não temos a pretensão de ensinar nada, até porque, no máximo, somos especialistas em ‘administração de brigas’. Mas desejamos testemunhar que nós também precisamos. Sozinhos, é difícil”.
Claudia e Manu estão juntos há cinco anos. São muito diferentes entre si, inclusive na aparência. “Estes cinco anos serviram para entendermos por que vale a pena se casar, não tanto para preencher nossas diferenças”, conta Claudia, em breve médica clínica geral. “Quero me casar com ele porque mantém viva em mim a tensão em direção a algo que vai além de nós mesmos”. E ela aprendeu isso olhando para Francesca e Carlo. “Eles também discutem. Às vezes, poderíamos continuar discutindo indefinidamente. Porém, há um momento em que é preciso deixar entrar outra medida e parar. Não pelas boas maneiras, mas para deixar ao outro espaço para ainda nos surpreender”. Mesmo que fosse a centésima discussão, já estaria disponível para a centésima primeira. Exatamente como diz o Papa no final de Amoris laetitia: “Famílias, continuemos a caminhar, o que nos é prometido é sempre mais!”.
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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón