Aqui no Canadá moro em um residence da universidade. O início foi duro e dramático. Todos lhe cumprimentam e sorriem, mas ninguém se interessa de verdade por você. Definirei como “o reino da indiferença”. Na manhã seguinte à minha chegada, acordei e, ainda um pouco perdida, fiz a única coisa que para mim tinha um sentido: procurei uma igreja. Descobri que, na catedral, todos os dias celebram missa às 12h10; então, fui para lá e me senti em casa.
Comprei algumas coisas para cozinhar (temos uma cozinha comunitária): uma panela, um prato, um copo... e, a certo ponto, dei-me conta de que estava sozinha, desesperadamente sozinha. Num lugar belíssimo – há um lago, uma grande quantidade de verde, os estudantes que caminham pela rua – mas sozinha, pela primeira vez em minha vida. E, dois dias depois, não aguentava mais. Porém, acontecia algo de estranho: embora sendo muito preguiçosa, naquela situação (onde ninguém me via nem podia me chamar a atenção) usei bem o tempo, fazendo compras, cozinhando... Eu podia comer apenas um sanduíche – um ano atrás teria feito isso –, mas nestes anos de universidade na Itália, morando em um apartamento com outras amigas, cresceu um amor e uma gratidão pelo modo como fui tratada, que me descobri mudada, e olhando-me em ação percebi que fazia aquelas coisas não porque alguém me olhava, mas só por mim.
Porém, não bastava. Estava profundamente inquieta. Passei todo o primeiro dia me esforçando, quase inventando alguma coisa para reconhecer Cristo, como se eu é que tivesse que construí-Lo. Tentava em vão e nada me satisfazia (as poucas vezes que tentei interagir com alguém do meu andar não tiveram sucesso: comiam todos sozinhos em seus próprios quartos). Ontem de manhã, quando acordei, um pensamento me veio: “eu não tenho que fazer nada, Ele pode tudo, até mesmo vencer esta minha solidão imensa. Relaxa, Ele está presente!” E tudo começou a mudar. Logo que entrei na catedral, uma senhora de nome Marean, aproximou-se para avisar que não haveria missa, mas que eu poderia ficar para a oração do terço. E eu: ”Ok, mas não sei a Ave Maria em inglês...” Então me ofereceu um livro de orações e rezamos o terço nós duas: ela ao microfone, no altar; eu na primeira fileira de bancos. Não podia acreditar! Então, perguntou-me quem eu era, de onde vinha, o que fazia ali... Depois me disse: “Se quiser, passo seu e-mail ao capelão da universidade, e assim poderá conhecer algumas pessoas”. Finalmente, alguém que me olhava de verdade, alguém com um rosto que se interessava por mim. E já aqui, o que posso dizer? Ele não se faz esperar quando O procuro.
À noite aconteceu outra coisa. Enquanto preparava o jantar, na cozinha comunitária, chegou um rapaz indiano e começamos a conversar. Também ele é muito solitário: há um mês no Canadá, percebia-se que tinha um desejo desesperado de estar com alguém. Dessa forma, nos organizamos para jantar juntos no dia seguinte. Eu tinha preparado macarrão e ele frango apimentado. Ao me deitar, pensei: “As coisas estão melhorando”, mas alguma coisa ainda não acontecia. No dia anterior, a minha objeção era “Como faço, Jesus, para sozinha, crescer no relacionamento contigo? Preciso de relacionamentos humanos, foi assim que sempre Te reconheci”... Mas, mesmo agora, em que havia o indiano com quem podia estar, continuava insatisfeita. Aquele não era o ponto: compreendi-o no dia seguinte, lendo o e-mail de uma amiga.
Quando vi aquele e-mail, fiquei imediatamente comovida, não tanto pelo que estava escrito, mas porque me dei conta de todo o bem que há na minha vida. “Não falta Deus, falta o eu”. Não que meu eu não existisse, mas estava preocupada em impor a minha imagem sobre a realidade: conhecer gente, encontrar amigos... Depois, aquela frase da Escola de Comunidade: “Tu me procuras em qualquer coisa!”. Eis porque não estava satisfeita. Não que eu não O procurasse, mas, de novo, como diz a Escola de Comunidade: “Sei que desejo o infinito e que este infinito existe porque tenho sempre saudade dele, mas cada dia me agarro ao particular, vou atrás de qualquer coisa que, depois, me deixa insatisfeito”. Não sei explicar melhor... Partia com o pedido d’Ele, mas, um instante depois, já o tinha reduzido. E, ao contrário, que respiro, que liberdade, que alegria quando se redescobre a profundidade do desejo e, sobretudo que existe Alguém que te responde sempre e em qualquer lugar. Como se todos aqueles pequenos sinais dos dias anteriores (a senhora Marean, o indiano...) estivessem finalmente sob a verdadeira perspectiva.
E todo o resto é abstrato e sentimental: estou certa porque fiquei mudada imediatamente. As coisas que primeiro me pareciam uma maldição, um cansaço ou um problema, de repente se tornaram belas. O lago, todo este tempo para mim, e até mesmo a solidão, se tornaram uma alegria, porque é a condição primária na qual estou continuamente desejosa e mendicante d’Ele. Muitas vezes, caminhando, digo: “Vem, vem Jesus”. Assim, depois de ter lido aquele e-mail, fui jantar com o indiano cheia de alegria e serenidade. Sem ter a ânsia do “ter que fazer”, mas apenas olhando o que existe ali para mim. E poderei descrever o dia de hoje, passado sempre na mesma solidão e, então, que diferença em mim. De novo posso dizer: “O meu eu é consistente”. E posso aproveitar das coisas: tomar sol à beira do lago, estudar, resolver todas as questões burocráticas, não mais ter medo. Não é um discurso porque eu me descubro diferente enquanto ajo. O cansaço não desaparece do nada, mas também não é objeção, absolutamente. É impressionante e é apenas o início...
Francesca, Kingston (Canadá)
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