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CINEMA/VÍDEO

Tudo pelo poder

por Antonio Autieri
17/02/2012 - A campanha eleitoral de um candidato democrático para a presidência dos Estados Unidos se torna uma dramática tomada de consciência para um jovem e brilhante assessor de imprensa

Trata-se do último comício, entrevista, golpe baixo para conseguir cada voto, nas primárias democráticas em Ohio. Em disputa, a candidatura para as eleições presidenciais dos Estados Unidos. Michael Morris é brilhante, bonito, agnóstico, imparcial, progressista (a favor das uniões homossexuais, em defesa do ambiente, contra a guerra e os gastos militares); diz sempre a coisa “certa”, a que o seu eleitorado moderno quer escutar. E o diz com grande convicção e fascínio. O seu rival é bem mais insignificante, e talvez “beato”. Mas a vitória em Ohio não está segura. Um poderoso senador negro ameaça vender o seu apoio (e o de seus 300 preciosos delegados) para quem oferecer mais, em troca de um lugar de importância no futuro governo. Obviamente, o honesto Morris recusa todo acordo proposto por seus colaboradores, em primeiro lugar o estrategista Paul Zara, experiente e cínico, e o assessor de imprensa Stephen Myers, de cujos olhos idealistas vemos os eventos se desenrolando. Para Steven, Morris é a pessoa certa, ou melhor, a única possível, para mudar os Estados Unidos e o mundo. Ou ele tem razão ou é um iludido, como lhe disse com perfídia a intrometida jornalista Ida Horovicz (“você acredita que ele vai mudar as coisas?”). Enquanto isso, Steven se depara com uma bela e jovem estagiária, que terá um papel determinante no desencadear dos eventos, além do diabólico convite para um inocente bate-papo com o chefe de gabinete do rival...
Um filme político com reviravoltas de um thriller, do qual é bom que se saiba o mínimo antes de ver o filme, ou apenas um thriller político? Tudo pelo poder, baseado na obra teatral Farragut North de Beau Willimon, foi concebido antes da era Obama; George Clooney, que é o diretor e co-roteirista, além de intérprete no papel do fascinante candidato à presidência (com a mesma generosidade do seu filme anterior, Boa noite e Boa sorte, em que deu espaço a colegas muito bons e cavou um papel decisivo para si, apesar de secundário), interrompeu as gravações quando Barack Obama, apoiado por ele com convicção, começou sua fulgurante corrida para a Casa Branca, para não carregar de cinismo aquele período de esperança. Agora, um obamaniano ainda mais convicto, mas talvez um pouco desiludido por causa das esperanças de mudança frustradas, voltou ao texto com um filme amargo, que leva a pensar nos simpatizantes do atual presidente e na ingenuidade que circundaram a sua “epifania” política (os cartazes de Morris têm o mesmo recorte gráfico e estético dos que foram idealizados na época para Obama). Não se parece tanto com uma acusação demagógica sobre o nivelamento por baixo de todas as posições políticas (mesmo se todos deem o pior de si), mas muito mais uma sofrida e madura consciência do que a política pode se tornar, entre traições (de onde se entende o título em inglês – The Ides of March – que remete à expressão latina Idus Martii, em referência ao décimo quinto dia de março do ano 44 a.C., em que Júlio César foi traiçoeiramente assassinado; ndt) e luciferinas sutilezas.
A corrida eleitoral é revelada em toda a sua torpeza; e pensar que um homem sozinho seja capaz de mudar as coisas – por causa de ideais que podem frequentemente deixar o lugar para cálculos e interesses funestos – é uma perigosa utopia. Perigosa para quem chuta o balde ou para quem acaba vendendo a alma para o diabo, perdendo as esperanças com as quais havia se dedicado generosamente a serviço de uma causa. Não tão nobre quanto parecia ser.
Mas, tudo isso serviria apenas para conceber um panfleto pessimista, mas pouco apaixonante para o espectador, se não fosse revestido de toda a qualidade cinematográfica possível. O roteiro, escrito por Clooney com Grant Heslov (que dirigiu o filme Os Homens que Encaravam Cabras, de 2009), é rico em diálogos fulminantes e situações iluminadas (em algumas sequências, a luta política é descrita com cenas de filme sobre a máfia: com a prestação de contas final nos fundos de um bar ou alguém sendo largado de um carro parado num beco), a direção é atraente e consegue capturar a atenção durante todo o filme (que chegamos a querer que não acabe), os atores são o que há de melhor no cinema americano. Se Clooney é muito mais do que o astro perseguido pelos tabloides, mas um ator de classe, o jovem Ryan Gosling, apreciado no recente Drive (mas também em Tolerância Zero, em A garota Ideal e em Diário de uma Paixão), confirma a sua enorme qualidade; enquanto que em papéis secundários temos gigantes como Philip Seymour Hoffmann, Paul Giamanti e Marisa Tomei, e também Evan Rachel Wood, como a estagiária. Depois de ter inaugurado a Mostra de Veneza, em 2011, dos Globos de Ouro parte a sua corrida para os prêmios principais. Quer vença ou não, seguramente é um dos filmes norte-americanos do ano.

The Ides of March
EUA, 2011, 98’
Gênero: drama
Direção: George Clooney
Elenco principal: Ryan Gosling, George Clooney, Philip Seymour Hoffmann, Paul Giamatti, Marisa Tomei, Evan Rachel Wood, Max Minghella, Jeffrey Wright, Jennifer Ehle
Temas: poder, política, eleições, acordos, corrupção, traição
Censura: 14 anos

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