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OS FATOS

Os Cavaleiros que tomaram Washington

por Roberto Amoruso
01/03/2011 - Toda sexta-feira alguns rapazes se encontram com padre Roberto, que está em missão nos EUA. Entre cantos e jogos, floresce uma amizade que está mudando suas vidas, inclusive na escola
A ilha de São Clemente, em Maryland.
A ilha de São Clemente, em Maryland.

Desde que cheguei aos Estados Unidos, em setembro de 2005, dou aulas numa escola católica em Washington. Com um grupo de rapazes do Ensino Médio comecei uma experiência educativa chamada Knights of St. Clement: os Cavaleiros de São Clemente.
Este nome vem de uma ilha, ao sul de Maryland, que visitamos em um de nossos acampamentos: ilha de São Clemente. Ali encontramos um pequeno museu, com alguns quadros que contam a vida dos primeiros peregrinos católicos: fugidos da Inglaterra (*1), queriam viver nesta terra - Maryland, isto é, “terra de Maria” (*2) e desejavam desembarcar no dia da Anunciação. Esperaram no navio, por alguns dias, que chegasse o 25 de março. Isso nos tocou ao ponto de batizarmos o grupinho nascente com o nome de “Cavaleiros de São Clemente”.
Nossos encontros acontecem às sextas-feiras. Inicialmente, nos encontrávamos fora da escola: começávamos com um lanche, conversávamos entre nós e concluíamos com algum canto e jogos. Este programa permaneceu invariável; o que mudou foi o relacionamento de amizade entre os Cavaleiros que se consolidou e aprofundou.

A descoberta do canto
No último acampamento, em junho, depois de terminado o período letivo, participaram uns quarenta rapazes e moças do ensino médio, além de cinco adultos. Preparamos juntos a estada, distribuindo entre nós as tarefas (cozinha, jogos, atividades). Reunidos no acampamento, os jovens começaram a tomar notas dos acontecimentos do dia e, à noite, ao redor da fogueira, encenavam o que tinha acontecido durante o dia. E não apenas os mais extrovertidos; até aqueles que tinham dificuldade de dizer o próprio nome, diante de tão bela companhia, se envolveram na brincadeira. Isto surpreendeu a todos.
Um universitário de CL veio com o violão, organizou os cantos, ficava com os jovens do Ensino Médio e até os corrigia quando necessário. Quando começávamos a cantar, alguns não queriam tomar parte. Ele não se conteve: “Também eu, na idade de vocês, odiava cantar, me parecia coisa de mulherzinhas. Depois, escutando outros, descobri uma beleza para mim desconhecida e, a partir de então, comecei não apenas a cantar mas também a tocar violão”. Aconselhou-os e ficavam maravilhados e fascinados por aquele universitário. Ficamos a escutá-lo e mudaram de postura. Outra surpresa foi a caridade entre eles: o que quer que fosse pedido - buscar água ou lenha, acender o fogo ou reorganizar o espaço - estavam sempre disponíveis.
Porém, a coisa mais interessante, ainda mais do que essa disponibilidade, foi o olhar e julgar o dia com o critério de que o que acontece não é obra do acaso, como ensina a nossa “regra”.

A regra da sexta-feira
Em 2007, li o texto de uma conversação de Julián Carrón com alguns responsáveis de CL que me impressionou profundamente ao ponto de querer comunica-lo de maneira simplificada aos Cavaleiros. Então, formulei uma regra, com três pontos: 1. “O Senhor está propondo a você alguma coisa de grande, neste momento; 2. Se consegue ver isso, fale ou escreva; 3. Se não o vê, recite um Memorare para conseguir ver.”
Começamos a perguntarmo-nos se alguma coisa havia nos tocado durante a semana; nos primeiros encontros, emergia pouco ou nada; os rapazes tinham dificuldade de lembrar o que acontecia nas aulas ou fora delas. Depois de alguns meses, alguns Cavaleiros começaram a contar alguma coisa que lhes tinha acontecido, procurando explicá-lo. Um dos primeiros exemplos foi o de uma moça que, referindo-se a uma bonita lição do professor e que tinha impressionado muitos deles, disse: “Aqui é Jesus que quer me dizer algo”.
A partir de então, a regra se tornou a forma da nossa reunião da sexta-feira. Começamos com uma oração (o Glória ou o Memorare) e pedimos aos santos e também a dom Giussani que nos ajudem a permanecermos juntos. Rezamos também ao final do encontro mas com intenções específicas : por uma pessoa que não está bem ou por alguém que procura emprego ou um companheiro cuja família está em dificuldade. Nesse momento estão muito atentos: veem a conexão entre o que o Senhor está realizando e aquilo que acontece em suas vidas. As situações se esclarecem enquanto que, antes, eram como invisíveis. O Memorare se torna assim o olhar mais profundamente para as pessoas que estão perto, o acompanhamento para as suas necessidades (econômicas, físicas, espirituais) e o pedir a Nossa Senhora para ajudar aquela pessoa e nós mesmos.
Da regra nasceu ainda a “promessa” que prevê um Memorare por dia e depois um ato de caridade, em casa ou na classe. Isto está produzindo frutos muito bonitos: acontece um “cavaleiro”, pela primeira vez, dizer a sua mãe “quer ajuda?”. Os próprios pais estão maravilhados: quando vêm buscar o filho (nós os esperamos à saída das aulas e os levamos a uma paróquia próxima), falam conosco, principalmente as mães e nos contam a mudança dos filhos: não brigam mais, ajudam em casa, começam a abrir os olhos para as coisas que acontecem a seu redor.

A novidade da repetição
Reproponho a regra a cada sexta-feira, sobretudo depois da promessa e vejo que todos a levam a sério. Alguma vez, claro, alguém se esquece mas o fato de retomá-la toda semana se torna uma possibilidade de recomeçar sempre. Descobri assim a importância da repetição (para essa idade de modo particular mas também para mais velhos).
Encontramo-nos e sabemos as razões do porquê o fazemos; não é simplesmente um jogar juntos. E também não é mais qualquer coisa de extraordinário. Se, no início, se recordavam muito pouco do que havia acontecido durante a semana, agora começam a olhar a semana com atenção pontual: “Segunda-feira me aconteceu isto... quinta-feira aconteceu que...”. Longe de ser uma obrigação chata, a repetição se torna sempre uma novidade. Continuar a perguntar: “O que muda ver Jesus, o que ensina através das coisas que acontecem?” (regra número 1) é a coisa mais importante. Passado um tempo, se notam os frutos que fazem compreender que é o Espírito Santo agindo.
Concluindo: a oração lhes faz abrir os olhos e ficar mais atentos. Os jovens, sobretudo nessa idade, tendem à distração total, seja na classe, seja em casa. Aqueles que vivem a experiência dos Cavaleiros tem outro modo de se portar na escola, um outro modo de jogar. Se encontram um papel no chão, recolhem-no e oferecem aquela ação pelos Cavaleiros ou por qualquer um que precise. Uma vez, repeti para eles uma frase de Santa Teresa: “Se recolhe mesmo uma agulha com amor ou por amor, pode ajudar Jesus a salvar uma alma”. Quando se lembram, se vê.

Notas:
(*1) Após a morte da rainha Maria, católica, que reinou entre 1553 e 1558, os católicos eram perseguidos na Inglaterra porque a religião oficial passou a ser o protestantismo.
(*2) O nome da terra havia sido dado em homenagem à Maria, na época em que ela foi rainha.

(Texto extraído do site da Fraternidade São Carlos Borromeu)

 
 

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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

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