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OS FATOS

Padre Ricci, fé e livros contrabandeados

por Luigi Geninazzi
02/06/2011 - Vinte anos depois de sua morte, um livro recolhe as memórias de amigos e discípulos de “Dom Quilômetro”. A recordação de sua incansável tensão missionária, da América Latina ao Extremo Oriente, passando pela Europa Oriental...
Padre Ricci com o teólogo tcheco Josef Zverina.
Padre Ricci com o teólogo tcheco Josef Zverina.

Chamavam-no de “Dom Quilômetro”, por causa de seus dois metros de altura, mas também por causa de seu incansável viajar através do mundo. Francesco Ricci foi um explorador moderno que, desde os anos 1960, se dedicou a descobrir o Leste Europeu, dando voz outra vez àquela que foi sumariamente definida como “Igreja do silêncio”
Evocar a sua figura, vinte anos depois de sua morte, ocorrida no dia 30 de maio de 1991, significa reavaliar o arquétipo do intelectual cristão europeu, que não se contenta em pensar o mundo, mas se lança “Até aos extremos confins da terra” (Fino agli estremi confini dela terra), título sugestivo do livro, publicado por estes dias na Itália pela editora Itaca, que recolhe as recordações e as reflexões de muitos que foram seus amigos e discípulos. Da mesma maneira que seu grande homônimo Matteo Ricci, o evangelizador da China, também Padre Francesco era animado por um ímpeto missionário que fazia dele um homem capaz de tecer relações com todos, marcando sua extraordinária fecundidade espiritual. Diferentemente do padre jesuíta, que viveu no século XVI, Padre Ricci viveu num tempo onde, para dizer com as palavras de Olivier Clément, “o catolicismo ocidental estava se retirando da vida do mundo”. Contra isso, Padre Francesco Ricci reagiu com todas as suas forças. Era atormentado pelo drama de um cristianismo que, depois de vinte séculos, parecia cair na marginalidade cultural e na insignificância social. Encontrou o antídoto para isso no Movimento de Comunhão e Libertação, fundando, nos anos 1950, em Forlì, a Juventude Estudantil, tornando-se o “primeiro e maior companheiro do nosso caminho”, disse dele Dom Giussani.
Destacava-se por sua altura não apenas física como também intelectual. Homem de cultura vasta e comunicador fascinante, tinha um olhar que abraçava o mundo inteiro. Com intuição genial entendeu que a renovação da Igreja aconteceria não a partir do centro, identificado tradicionalmente com o cristianismo ocidental, mas a partir dos confins da catolicidade radicada em povos distantes. Daí é que nasceu seu interesse pelas nações e Igrejas de fronteira, o seu contínuo deslocar-se entre a América Latina e o Leste Europeu, com rápidas passagens também pelo Extremo Oriente. Começou a viajar além da Cortina de Ferro, encontrando personalidades e realidades eclesiais que depois foram conhecidas na Itália, através do Centro de Estudos da Europa Oriental (Centro Studi Europa Orientale – CSEO –, em italiano). Nomes que, mais tarde, se tornariam famosos, como o do filósofo polonês Tischner, o do teólogo boêmio Zverina, o do dissidente tchecoslovaco Havel. Movimentos como “Luz e vida” na Polônia e “Regnun Marianum” na Hungria. No ano de 1968, o CSEO publicou o texto de um certo cardeal Wojtyla...
Frequentemente, Padre Francesco brincava: “a minha vocação é ser padre, mas de profissão sou contrabandista de livros”. De certa maneira, ele preparou o caminho para o futuro Papa polonês, de quem se tornou próximo ainda quando era bispo na Cracóvia. “O vento do Leste se fez impetuoso e levou para a Cátedra de Pedro o filho de um povo cristão, que guiará a humanidade no caminho em direção à liberdade”, escreveu com palavras proféticas em outubro de 1978.

* Extraído do Jornal Avvenire, do dia 28 de maio de 2011.

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