“Crescemos num ambiente ateu mas tínhamos perguntas, como todas as crianças. Havia uma coisa, sobretudo, que me interrogava: a morte. Perguntava a meu pai: ‘Mas, e depois, o que acontece?’ E ele: ‘Nada. Deixa-se de existir. É como antes de nascer: não existíamos’. Não me convencia, e agora sei o por quê”. Alejandro tem 36 anos, ensina inglês e complementa a renda fazendo pequenos trabalhos de informática. Ajudam a levar em frente um país onde, do verdadeiro socialismo, sobraram duas coisas: certos mitos, um pouco gastos, e a pobreza. É a primeira vez que alguém de Cuba consegue chegar a ARAL, a Assembleia dos responsáveis da América Latina, organizada há alguns anos, em São Paulo, por Comunhão e Libertação. Ele chegou com Conrado, 42 anos, professor de Química. Antes de desembarcar do voo, depois de uma odisseia de cartas e permissões, perguntaram-se: “Não conhecemos ninguém; como faremos para reconhecer quem veio nos buscar?”. E se deram como resposta algo que nos comove: “Olhemos nos olhos. Devem ser os mesmos que vemos em Passos”.
E assim foi. Literalmente. Encontraram quem estavam esperando, desde sempre, desde quando aquele menino insistia em perguntar e suas palavras batiam contra uma parede. “Diziam-me que era absurdo crer em Deus, que não existe nada além do mundo que vemos, que isto é o que diz a Ciência”, conta Alejandro. O primeiro empurrão chega aos 25 anos, quando encontra uma família católica. “Houve um forte impacto. Seu modo de viver me impressionou, eram diferentes. Pensava o cristianismo como uma coisa estúpida, que não tinha nada a ver com a vida. Porém, vendo como se tratavam e o afeto que tinham por mim, disse a mim mesmo: a fé não pode ser aquilo que me contaram”.
Foram anos duros, de crise, de deslocamentos à procura de trabalho, até que Alejandro chegou a Matanzas, a noventa quilômetros de Havana. “Minha mulher estava longe. Foi um momento difícil. Lembro-me de um dia em que estava sentado no chão, num canto, junto à porta de uma casa, e me dei conta, pela primeira vez, de que era dependente: não me fazia por mim mesmo, não me dou as coisas sozinho. Tinha começado a fazer alguns trabalhos na Mitra. Disse a mim mesmo: tenho necessidade, se existe um Deus, quero ver se me ajuda. Fui falar com o Bispo”. Ali começou um caminho feito de leituras do Evangelho e de reflexões. “Comecei a entender que era a ajuda que procurava”. Por quê? “Naquele momento, não tinha as palavras para dizê-lo. Agora, com Giussani, posso fazê-lo: correspondia. Correspondia à minha experiência elementar. Era algo que estava mudando a minha vida. Do ponto de vista econômico, não tinha acontecido muita coisa, mas do ponto de vista humano, sim. Estava me tornando mais certo”.
O encontro com Conrado acontece aqui. Ele é de família católica, tinha estado na Itália, tinha conhecido CL em Florença. “Conheci a Companhia das Obras. Comecei a frequentar a Escola de Comunidade. Fui aos Exercícios dos universitários, em Rímini”, conta. “Lembro-me da pergunta que fiz a uma amiga: ‘Mas, o Movimento são estes cinco mil?’, e ela me respondeu: ‘Não, o Movimento é o seu relacionamento com Cristo. É aquele a ser construído’. Foi o primeiro passo”. Voltou a Cuba marcado por uma amizade e pelos textos de Giussani. Em Matanzas, na paróquia do Carmelo, ajuda os sacerdotes, colabora nos encontros de preparação ao matrimônio. E, em 22 de novembro de 2012 (“recordamos bem porque é o aniversário de sua mulher”) lhe acontece algo. “Tínhamos feito um trabalho na Mitra”, conta Conrado: “Nossas mulheres começaram a falar. Passou o Bispo e comecei a conversar com ele. Surgiu o assunto do Movimento, de Passos, Dom Giussani. Estávamos saindo e enquanto estávamos na porta, Alejandro me disse: ‘desculpe-me, mas, do que falavam?’. Eu lhe respondi e lhe falei de O senso religioso. No dia seguinte sua mulher veio buscar o livro em minha casa”. Três semanas depois, se reencontraram. “Disse-me que ficara impressionado e que queria conversar: ‘Compreendi que ali estava o que é preciso para viver’”.
Um encontro puxa outro. Então, em Matanzas, Cuba, nasce uma Escola de Comunidade. “Tínhamos começado no dia 22 de fevereiro de 2013. Aniversário da morte de Dom Giussani”, observa Conrado: “Por acaso, não de propósito: ‘Quando começamos? Segunda? Terça?’. Combinamos aquela data. Depois, uma de nós, lendo a orelha da capa do livro, diz: ‘Sabem que dia é hoje?’”.
Agora somos nove, contando com Carlos, “professor de Filosofia, marxista, aposentado”. Sempre aparece alguém de fora, até mesmo turistas de passagem. “Já encontramos gente do Peru, da Alemanha”, diz Conrado. Fazem Escola de Comunidade juntos. “Imagine que, certa vez, havia uma de nós que estava em crise, decidindo entre ficar ou sair. No dia seguinte, chega-me um e-mail de uma garota alemã: ‘Alejandro, não nos conhecemos mas sou de CL e estou de férias, em Cuba. Soube que existe gente do Movimento aqui. Para mim é a segunda família. Gostaria de ver vocês’. Falei para nossa amiga: este e-mail vem do céu, não acha?”.
Contudo, a mudança é maior dentro de si. Alejandro conta assim: “Com Giussani encontrei o rosto de Cristo, sem véus, sem névoa, com uma limpidez e uma certeza absolutas. Mesmo as dificuldades que posso viver servem para fazer crescer esta certeza. A vida se tornou a confirmação da fé, como ouvi Carrón dizer”. E, em que você vê que o ajuda a viver? “No quotidiano: alguma dificuldade no casamento ou, a morte de meu sogro, há dois anos. Giussani me deu as palavras para ajudar minha mulher e não eram palavras sentimentais: eram razões que chegavam diretamente ao coração. A morte sempre me inquietou, mas ali me dei conta que o Senhor me presenteava com a serenidade para enfrentá-la. Tenho amigos de infância em Cienfuegos. Não são religiosos, criticam a fé. Depois de minha conversão, é uma discussão contínua. Eles contradizem, mas eu, agora, graças a Giussani, respondo com serenidade e com muito mais argumentos. Como ele dizia aos professores do Berchet: ‘Estes garotos falam mal dos padres e da Igreja e vocês não sabem o que lhes responder...’”
Conrado também fala de Giussani. “Quando o encontrei, tive a confirmação daquilo que vivia, mas também um valor desconhecido, que não imaginava. Ajudava-me muito a viver em família, nos relacionamento com minha mulher e com meus filhos. Educar os garotos numa sociedade tão materialista é difícil. E também me ajuda na escola, na postura diante de meus alunos”. Como? “Percebo que não basta ensinar a minha matéria. Desejo que se tornem homens, por eles, por suas famílias e pela comunidade. Um químico também pode ser religioso. Um cientista pode ter fé. Quero fazer com que eles compreendam isso”.
É o que está descobrindo o pai de Alejandro que encontrou um exemplar de O senso religioso. “Por enquanto não me fala nada e eu não lhe pergunto nada para que não se sinta pressionado. Mas minha mãe diz que ele não se separa do livro. Lê, relê e às vezes diz: ‘Este é um homem que sabe muitas coisas’. Por enquanto, disse-me apenas que Giussani cita muitos autores que ele não conhece. Ele leu muito, mas não teve acesso a certa literatura”. E aquela pergunta que fazia a ele quando era menino? “A resposta é o mistério. É Cristo. É Ele o sentido de tudo. É o caminho, a verdade, a vida. Uma das coisas que mais me ajuda é ter lido recentemente aquela frase de Pavese. Lembra-se? ‘O cansaço do viver que quebra as pernas’. Pois então, a vida em Cuba é assim: quebra as pernas. Giussani me ajuda a ir a fundo. Durante a semana, vejo o rosto de Jesus na rotina que vivo. Ele me diz; ‘nesta circunstância que te paralisa existe algo mais, uma ocasião para que Me vejas’. A Escola de Comunidade me ajuda nisto”.
E você, Conrado? O que mudou para você? “A liberdade. Sou muito mais livre, em tudo”. Por exemplo? “Eu me surpreendi afixando um cartaz na Universidade e discutindo com os professores de Cultura universitária para convidá-los a uma apresentação coral em uma igreja. É algo que rompe com os esquemas; este tipo de aviso, habitualmente, só acontece na paróquia. Ou, quando tenho os encontros de formação para o matrimônio, agora exemplifico com o que me acontece. É um desafio, mas sei que vivo uma experiência que me permite comunicar algo. Na noite anterior ao encontro, minha mulher me pergunta: ‘como se preparou, o que vai dizer a eles?’. Antes, era uma preocupação. Agora respondo: ‘vou dormir e amanhã veremos’. Estou tranquilo, porque estou certo.”
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© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón