Tudo começou neste verão, assistindo ao sofrimento dos milhares de refugiados no Iraque, obrigados a abandonar as próprias casas, a própria terra. E suportavam tudo isso para não renunciar àquilo que, acima de tudo, constituía a identidade deles: o pertencimento a Deus. Diante desta dor, um espírito de protesto e de comoção começou a ferver dentro de mim.
E então, começaram as aulas e, logo no primeiro dia, eu, Guerzo (o adulto que guia a escola de comunidade dos colegiais do meu colégio), Marta e Mary nos encontramos em um bar para um café. Decidimos dar continuidade ao grupo de colegiais também neste ano; retomamos novamente as razões da nossa amizade. E, a partir daí, a necessidade de estender a todos o convite a aderir àquilo que nos faz sermos sempre nós mesmos. Como convidar os recém-chegados, aqueles que acabaram de entrar no universo do Ensino Médio? Nasceu a necessidade de convidá-los não tanto para a reunião semanal dos colegiais, para falar e fazer discursos, mas convidá-los à vida, por meio de algo que possa aderir à provocação que neste momento a realidade nos coloca diante dos olhos. E que tema mais tocante do que a situação emergencial no Iraque?
Deste modo, naquele pequeno bar, começa esta aventura, que nos levaria a construir algo maior do que nós mesmos. Dois dias depois, fomos à reunião dos responsáveis dos colegiais na Lombardia e descobrimos que os meninos do Ensino Médio do Colégio Sacro Cuore de Milão, fizeram um panfleto que expressa a mesma provocação que nos tocou. Título: “E nós, para quem estamos dispostos a dar a nossa vida?”. O que me toca e me une àqueles homens tão distantes, pelos quais eu nem poderia me interessar, é justamente a pergunta deste panfleto. Os cristãos iraquianos têm o mesmo coração e a mesma humanidade que eu tenho. Assim, se os vejo capazes de um gesto desta grandeza, sinto-me também chamada a me questionar: Pelo que eu morreria? Ou para o que eu vivo?
Essas perguntas, tão grandes e profundas, nos impulsionaram a organizar um evento para recolher fundos destinados aos refugiados. Convidamos não somente a nossa escola ou a comunidade de CL, mas cada homem e mulher. Para ser realizada, a ideia original precisou de mais mão de obra, a fim de que a iniciativa se tornasse realmente bela e atraente. É realmente impressionante dar-se conta de quantas pessoas aceitaram nos ajudar, mesmo aquelas das quais eu nunca esperaria ajuda.
Assim, o projeto cresceu, entre mil peripécias e batalhas, entre sacrifícios, desilusões e momentos de raiva. E encontrei-me diante de algo maior do que eu: adultos que não cortaram nossas asas, meninos que estudaram durante a noite porque à tarde foram panfletar pelas ruas, controlar o salão, recolher objetos para o leilão beneficente, ensaiar as músicas e as leituras para o evento. Dois atores cômicos aceitaram vir gratuitamente divertir o público. A Prefeitura nos cedeu o uso do salão e não nos cobrou nada. Até mesmo o geômetra da Prefeitura ficou conosco dois dias para nos ajudar a montar tudo. Um pai utilizou todos os seus horários de almoço para nos ajudar com a infraestrutura, correndo por Milão de bicicleta. Tantas meninas cozinharam quilos e quilos de tortas salgadas. Uma amiga minha ensaiou os cantos com 38 graus de febre e as pernas que mal conseguiam segurá-la em pé. Vi coisas maiores do que eu. E durante o tão esperado evento, foi surpreendente ver as pessoas que entravam e que eu acolhia na recepção.
Enquanto fazíamos os preparativos, me entristeci com o fato de que ninguém lembrou de que foi minha a ideia de tudo isso, e por não ter subido no palco nem para fazer o discurso de encerramento da noite. Fiquei com inveja do fato de que a organização já não estava mais em minhas mãos. Mas toda a minha mesquinhez e raiva caíram diante de tudo que estava acontecendo à minha volta. Agora percebo que, se tudo isso não tivesse escapado das minhas mãos, essa iniciativa teria tido horizontes menores e reduzidos. Não trabalhei muito durante o evento: fiquei simplesmente atrás de um balcão. Mas aceitar o pequeno papel permitiu-me estar mais ligada ao significado do evento, que não era simplesmente o de recolher fundos.
Agora é como se nada tivesse acabado. Muitas vezes, durante a organização do evento, abatida por conta do cansaço e, principalmente, pelo peso de frequentar o último ano do Ensino Médio, pensei: “Assim que isso acabar, vou me dedicar aos estudos, e assim já dou logo conta desse enésimo compromisso”. E saboreava a liberdade. Mas me perguntei: “Mas então, porque estou organizando esse gesto?”. O que não poderá ter fim, de fato, é a experiência descrita acima. A experiência de como foi gerada esta grande beleza, ou seja, de como me deixei provocar e mover pela realidade. Agora entendi que a estrada citada por Carrón é a realidade que te provoca, no sentido de que, por meio dos acontecimentos, te chama pelo nome.
Miriam, Milão (Itália)
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