Os painéis estão ali, fixados nas paredes do claustro do Século XVIII. Algumas fileiras de cadeiras, uma mesa, o equipamento de som. Um gesto simples, como a fé antiga e nunca dormente do povo da ilha. Mas causa certa impressão ver aparecer o rosto de Dom Giussani entre estas paredes. Estamos em Havana Velha, no seminário de São Carlos e Santo Ambrósio. Foi por muito tempo o coração pulsante da Igreja daqui, e voltou a bater forte há três anos, desde quando o Cardeal Jaime Ortega o quis como sede do Centro cultural Padre Félix Varela. E hoje hospeda a mostra De mi vida a la vuestra (Da minha vida à vossa), inaugurada no dia 21 de junho.
“É uma iniciativa que partiu faz alguns meses, e gira em torno do fato que a comunidade, nos últimos anos, renasceu em Havana e em Matanzas”, explica Giampiero Áquila, que vive e leciona no México, mas vem com frequência a Cuba desde quando o cardeal Ortega lhe pediu para colaborar com o Centro de Investigación Social Avançada mexicano, no curso de graduação em Humanidades (120 estudantes nos três anos do curso “e uns sessenta calouros, dos quais sete são católicos”). Há tempo tínhamos “o desejo de nos colocar em jogo um pouco mais abertamente”, conta Áquila: “Imprimimos os painéis no México, e eu os trouxe para cá no outono”, logo após a visita do Papa Francisco. “Tivemos esta mostra em mãos durante um bom tempo, sem encontrar o momento oportuno”. Por fim a ocasião chegou, graças ao relacionamento com Gustavo Andújar, responsável do Centro Varela e diretor de Espacio laical, uma revista na qual escrevem grandes personalidades da política e da economia cubanas: “Disse-me que não conhecia bem o movimento, mas queria saber mais sobre ele”. A estima que o cardeal Ortega tem desde sempre por CL foi o remate. E Dom Giussani desembarcou em Havana Velha.
Gesto simples, justamente. A apresentação de Alejandro Mayo, um dos responsáveis do Movimento Comunhão e Libertação na ilha. A introdução de Jesus Carrascosa, que vem a Cuba desde os primeiríssimos tempos do nascimento de CL, vinte anos atrás (“queríamos que as pessoas tivessem uma ideia da cotidianidade simples da vida de Giussani”, diz Áquila), seis minutos de vídeo sobre o fundador do Movimento. E a colocação de Dom Giorgio Língua, o Núncio que chegou em março de 2015. Meia hora rica e densa, que merece ser retomada pela profundidade dos conteúdos.
Dom Giorgio lê a vida de Giussani à luz de três palavras: “Autoridade, misericórdia e fé”. A primeira, diz, é um traço que o marcou percorrendo a biografia do fundador de CL escrita por Alberto Savorana: “Nós adquirimos autoridade na medida em que vivemos o que dizemos, pomos em prática o que exigimos dos outros. Só assim somos críveis e, por conseguinte, temos autoridade. Missionários e não apenas profissionais. Dom Giussani não era um profissional da fé, mas sempre foi um missionário. Alguém que, toda vez que falava de Cristo, da Igreja, da sua fé, manifestava uma grande paixão, uma paixão que envolvia. Por este motivo era uma pessoa com autoridade”.
E depois, especialmente, a misericórdia, da qual Giussani sempre falou, mas com ainda maior frequência nos últimos anos da sua vida, “quando sente melhor o limite que avança” e esta palavra retorna “com maior frequência aos lábios, como se fosse o testamento de uma mãe aos seus filhos”. E o motivo de fundo Dom Giorgio o identifica nas palavras que Jorge Mário Bergoglio, então Arcebispo de Buenos Aires, pronunciou em 2001, no lançamento do livro L’attrattiva Gesù: “Depois de ter falado da fé como fruto de um encontro, ponto central das intuições de Dom Giussani, Bergoglio comentava: Não se pode entender esta dinâmica do encontro, que suscita a admiração e a adesão, se sobre a mesma não fizermos disparar – perdoem-me a palavra – o gatilho da misericórdia. Só quem encontrou a misericórdia, quem foi acariciado pela ternura da misericórdia, fica bem com o Senhor”. A própria moral cristã, lembrava o futuro Papa, “é a resposta cristã frente a uma misericórdia surpreendente”. E isto em Giussani é evidente.
Assim como também é evidente o terceiro traço característico, “a raiz da experiência nascida ao redor dele”: a fé. Língua o esclarece citando outro Papa, Bento XVI. Para ele “ficou marcada a criatividade da fé” de Dom Giussani. O que significa? “A fé nos torna criativos, não porque queremos inventar algo de novo, mas porque temos confiança em Deus, o Criador”. E a grandeza de Giussani “consiste em ter sabido transmitir aos outros esta sua convicção, deixando aos que o seguiam a liberdade de realizarem aquele maravilhoso projeto que Deus tem para cada um”. Por isto, acrescenta o Núncio, “podemos defini-lo como um grande educador, porque não procurou ‘dominar a vossa fé’, mas foi ‘colaborador para a vossa alegria’”.
O último ponto responde a uma pergunta: que papel pode ter uma realidade como Comunhão e Libertação em Cuba? Que utilidade pode trazer para esta terra? A resposta faz muitos dos presentes assustarem-se: “Creio que CL possa oferecer uma contribuição preciosa à realização daquilo que Papa Francisco disse aos jovens aos 20 de setembro passado, ao falar da necessidade de construir a amizade social”. Ou seja, colaborar à construção – ou reconstrução – do bem comum. “Não se trata de julgar-se superiores a ninguém, de querer ensinar alguma coisa, mas de oferecer, como dom, a contribuição de uma graça recebida”. E CL “pode oferecer hoje a sua contribuição formando pessoas que escutem, que reflitam e que saibam levar em consideração a opinião de todos, porque isto significa exatamente exercer a comunhão na liberdade”.
Depois, começam as visitas. A primeira é guiada por Dario García, jovem professor de Linguística em Havana, que sublinha como Giussani “entra em diálogo com o mundo contemporâneo não como intelectual, mas como alguém que quer educar”. E continuam as apresentações por uns dez dias de idas e vindas no claustro.
“As reações? Veremos”, diz Áquila. Entretanto relata e-mails que chegam, fala de Rafael, professor de Matemática, que começou a fazer Escola de comunidade (“eu havia tentado muitas vezes a possibilidade de encontrar a fé, mas inutilmente. Depois veio a hora dos Exercícios. E com esta mostra me parece ter encontrado um pai”). Ou, então, a Sílvia, que não conseguiu estar presente, mas convidou seu pai para ir “e quando voltou estava supercontente e me disse: eu na quinta-feira começo a fazer Escola de Comunidade”. Na revista Espacio laical deveria sair um artigo, “e é uma coisa importante aqui”, observa Áquila. Mas é apenas o primeiro capítulo. O próximo, no dia 13 de setembro. Em programa, ainda Dom Giussani. E Su vida, a biografia, cuja edição foi publicada recentemente em espanhol.
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