“Acredite, é a mesma alegria que se sente quando criança”. Paolo Nespoli, nascido em 1957, há tempos não é mais um menino. Mesmo assim, quando recorda os 157 dias na estação espacial internacional, seus olhos azuis se iluminam. De volta à Terra, em fins de maio, é o primeiro, entre os astronautas italianos, a ter participado de uma missão de longa duração : a MagiSStra, promovida pela AEE (Agência Espacial Europeia) para realizar dezenas de experimentos entre Física dos fluidos, radiações, teste dos equipamentos. Além dos cinco meses num laboratório tão grande quanto um campo de futebol que orbita a 400 km do solo, a uma velocidade de quase 8mil m/s: na prática, uma volta da Terra a cada hora e meia”. Um projeto que o mundo inteiro seguiu em tempo real pelo twitter, as breves mensagens que Nespoli mandava online todo dia, muitas vezes com espetaculares fotos do espaço: da muralha da China às pirâmides de Gizé; do Grand Canyon a uma vista noturna de Jerusalém. E também de ciclones, luas cheias, auroras boreais... “Ali, o que acreditava saber, não valia de nada; precisava reaprender tudo, desde o princípio; como uma criança que descobre um quarto cheio de brinquedos”. Mas, o que mais aqueceu o coração foram aqueles 15 minutos de diálogo com Bento XVI que, em 21 de maio, se conectou por vídeo com a tripulação. Pela primeira audiência espacial da História: “Um momento verdadeiramente intenso. Foi o Papa que nos fez as perguntas e fez com que nos sentíssemos importantes”. Paolo Nespoli, que vive em Houston (EUA) com a mulher, Aleksandra, e uma filha de dois anos (“Depois de todas essas ligações via vídeo, ela está convencida de que vivo na TV”), esteve recentemente na Itália para uma série de encontros, entre os quais “A atração do cosmo”, realizado dia 24 de novembro, no Centro Cultural Talamoni, em Monza.
Comecemos pelo princípio: como chegou de uma cidadezinha do interior ao espaço?
Cresci em Verano Brianza; frequentei o liceu científico em Desio. Comecei a Universidade mas não engrenava. Então, aos 19 anos, fui para o serviço militar. Frequentei a escola de paraquedismo e permaneci no Exército, entrando para as Forças Especiais. Após 18 meses no Líbano, aos 25 anos, perguntei-me o que de verdade queria fazer e ressurgiu uma ideia que havia tido quando menino: ser astronauta.
Quando lhe veio essa ideia?
Uns doze anos antes, diante dos astronautas da Apollo, na TV: via-os saltitando na Lua, falando uma língua desconhecida, fazendo as derrapadas com o jipe lunar... Pensava: “Quando for grande, também quero fazer isso”. Um sonho de um menino.
Mas, ao contrário...
Sonho transformado em realidade... Mesmo se, no início, a probabilidade era verdadeiramente baixa: não sabia uma palavra de Inglês, não tinha uma graduação. Porém, havia aprendido que é necessário sempre ter um objetivo e não se render diante do que não dá certo. Então, voltei à Universidade e me formei em Engenharia. E, em 1991 me tornei astronauta da AEE. Em 2007, após anos de cursos e treinamentos, o primeiro voo no espaço.
Mas não cortou os laços com sua cidadezinha.
A minha ligação com ela foi sempre muito forte. Quando moço, com uma dezena de amigos, ajudava na paróquia. Hoje, todos são casados e têm filhos, mas continuam morando lá. Toda sexta-feira à noite eles se encontram na casa de um ou de outro, diante de pão e salame, para falar da vida. Quando não estou do outro lado do mundo, participo.
O que lhe permite aceitar os desafios sem entregar-se?
Aquilo que recebi nos encontros da paróquia: certo olhar sobre as coisas, um modo de viver, uma educação. Aprendi que sempre existe esperança: todos podemos cometer erros, mas também repará-los e ir adiante. E também uma lição de vida no estarmos juntos, no colocar-se à disposição, no fazer pelos outros. Na estação espacial, é fundamental este trabalho de equipe: existe um permanente controle para perceber erros antes que aconteçam.
Por exemplo?
Para seguir determinado procedimento, chame alguém que o ajude. Um lê as instruções e o outro as coloca em prática, sempre se comparando com o outro. Como quando tive que preparar as roupas para o passeio espacial: não encontrava as peças, algumas voavam, estava atrasado... Então, chamei o centro de controle: “Houston, tenho um problema”.
E o que responderam?
Que estava lendo a página errada. Os erros aparecem em qualquer atividade científica. Se aperto o botão errado, o prejuízo é de milhões de dólares. Alguns erros, porém, levam a descobertas: pense nos post-it, nascidos da procura por uma cola especial; testam e percebem que não funciona; jogam tudo fora; depois, alguém percebe que aquele não colar podia ser uma vantagem. Tudo depende de como se apresenta a nós.
O que descobriu, tanto no erro, quanto no que funcionou bem?
Compreendi melhor os meus limites e, ao mesmo tempo, que é preciso desafiá-los. É o que digo sempre nas aulas: “Rapazes, sonhem; não cortem as asas”. Depois, é preciso trabalhar naquilo, acertar as contas com a realidade e ver onde leva.
Como é o planeta visto daquele extraordinário posto de observação?
Lembrava-me uma imensa nave no universo e pensei que devíamos concebermo-nos mais como humanos do que como franceses, americanos ou italianos. Em lugar de brigarmos, perceber que estamos juntos sobre a Terra. Sou apenas um mecânico, um eletricista espacial, não quero fazer Teologia. Mas, gostaria que o Papa pudesse ir ao espaço para depois ouvir suas impressões; também deveriam ir os poetas, os fotógrafos, os políticos...
Mesmo que apenas em vídeo, Bento XVI encontrou-os por alguns minutos.
Alguns dias antes, havia morrido minha mãe. Isto me levou a pensar no sentido da vida. Recebi muitas condolências e depois aquelas palavras do Papa: “Também rezei por ela”. Quando aconteceu o funeral, fizemos um minuto de silêncio e tudo parou nos centros de controle, desde o Japão até a Alemanha. Quando houve a ligação com o Papa, impressionou-me que toda a equipe quis participar: protestantes, ortodoxos, ateus... Encorajou-nos a levar até o fim nossa missão.
E hoje, depois da volta à normalidade?
Mesmo a reentrada é muito bonita. É um despertar dos sentidos: reaprender a ficar em pé e a caminhar. Redescobrir os sabores, os odores, a beleza de uma pizza entre amigos. Depois, contar, encontrar as pessoas... Diante dos olhos escancarados dos jovens, vejo neles que há algo que lhes interessa porque toca naquele motor interno que nos diferencia do restante da criação: a vontade, o irrefreável desejo de conhecer o que está à volta; ainda que muitos não vivam neste nível.
O que quer dizer?
Dou um exemplo. Adapto-me muito facilmente a muitas situações mas, ao mesmo tempo, não suporto as coisas mal feitas: um serviço que fica incompleto, um comerciante que cobra preços exorbitantes, um carro de aluguel em mau estado... por que não fazemos direito as coisas? Devemos tratar melhor daquilo que temos ao nosso redor. Ser críticos. Sim, almejar as estrelas.
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