Sábado, 24 de janeiro. Uma viagem de Barcelona a Cassinetta de Lugagnano para ver um amigo, o arquiteto Sandro Rondena. José Manuel Almuzara, arquiteto, e Etsuro Sotoo, escultor, desejam encontrar pela última vez o olhar de Sandro, aquele olhar que, com uma belíssima imagem, Sotoo comparou ao golpe de espada de um samurai. Daí vem a autoridade que todos reconhecemos em Sandro e que Sotoo expressou com exatidão: “Sandro é uma autoridade porque nunca desejou sê-lo, é uma autoridade porque vive”. E é isto que fez dele um amigo e um mestre. Depois de ter visto as imagens estupendas das obras de Sotoo na Sagrada Família, com a força de seu timbre de voz exclamou: “É isto o cêntuplo sobre esta terra!”, dirigindo-se a todos nós que olhávamos o que acontecia, porque era claramente a obra de um Outro. Perguntamos-lhe sobre sua amizade com Sandro Rondena e ele nos respondeu de seu ateliê na Sagrada Família, pouco antes de partir para o Japão.
Quando você conheceu Sandro?
Foi oito anos atrás, em 2007, eu fui convidado ao Meeting de Rímini, e no final da palestra fui rodeado por um grupo de estudantes que me enchiam de perguntas. Eram muitos. Atrás deles estava um senhor de barba que me olhava, um adulto. Ele vinha atrás, mas mantendo-se discretamente apartado atrás daqueles jovens que não paravam de disparar rajadas de perguntas. Enquanto respondia a todos, eu fui marcado pelo olhar desse senhor. Mesmo estando bastante longe de mim, aquele olhar era como uma ponta de espada de samurai que me traspassava. Mas não estava me ameaçando. Me despertava. Era um olhar que chegava direto ao ponto focal da alma de uma pessoa. O seu olhar me despertou: “Onde eu devo estar? Para onde devo ir?”. Foi como um balde de água gelada derramado sobre um bêbado. Assim, exatamente assim. O seu modo de pôr-se era humilde. Aguardava pacientemente atrás daqueles jovens. O seu modo de esperar era radical, como se fosse um fato decisivo. Como se se tratasse de vida ou de morte. Tão forte era nele a urgência de exprimir a sua pergunta.
Mas, afinal, o que ele lhe perguntou?
Não lembro a pergunta, mas era uma tarde de sol, como que tardia (Etsuro, como bom japonês, fala por imagens, e utiliza palavras características, poéticas, como esta para indicar um grande espaço de tempo, ndr.). Era o espaço da espera.
Por que você o quis como amigo?
Desde aquele primeiro momento Sandro e eu nos tornamos amigos. A nossa amizade não era como banhar-se juntos nas águas mornas do mar, mas era como caminhar sob uma cascata de água fria, em busca de alguma coisa grande e forte. Com ele não eram necessárias palavras. Ele sabia o que eu procurava e eu sabia o que ele procurava. Andávamos no mesmo ritmo de passos, buscávamos a mesma coisa. É esta a amizade.
Poderia-se dizer que Sandro foi um discípulo de Gaudí?
Sandro não copiava. Sandro olhava para a mesma direção de Gaudí, descobria aquilo que Gaudí gerava, vivia disto. Sandro tinha um método próprio seu. O importante para ele era doar felicidade a quem a procurava.
No final de janeiro você partiu de Barcelona junto com Almuzara para visitar Sandro. Eram seus últimos dias...
Aquela última visita foi uma confirmação física de quem ele era. Purificava-se cada dia mais. Eu já o imaginava, mas, ao encontrá-lo pessoalmente, eu vi nele a pureza. Era um homem de Deus. Eu me perguntava: “Como é que ele consegue pensar em tudo, colocar as coisas em ordem tão bem antes de morrer?”. Não era Sandro quem prevalecia, quem punha ordem, mas Deus mesmo.
O que lhe ficou dessa despedida?
Ele não tinha mais forças, estava na cadeira de rodas, e sentia calor. Fez um gesto na tentativa de tirar o agasalho. Conseguiu se levantar. Eu estava emudecido. Reuniu todas as suas energias, se levantou e me disse: “Tiau Etsuro. Até mais ver”. Não existe adeus quando já se vislumbra o eterno.
Quem é
Sandro Rondena morreu dia 30 de janeiro deste ano, aos 61 anos. Rosto histórico da comunidade de CL de Abbiategrasso (Milão), foi um conhecido arquiteto e “discípulo” de Gaudí. Assinou a restauração da Abadia cisterciense de Morimondo, na Baixada milanesa.
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