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LEITURA

Um caso de amor com o infinito

por Ana Luiza Mahlmeister
11/10/2011 - Na trama de "Fim de Caso" de Graham Greene, amante busca respostas pelo brusco rompimento de um relacionamento e acaba chegando a revelações surpreendentes que abalam suas certezas

O enredo de "Fim de Caso", de Graham Greene, é ambientado na Inglaterra em 1939, durante a guerra. Sarah Miles vive um casamento morno, praticamente estéril, e durante uma festa em sua casa, organizada pelo marido Henry, conhece seu vizinho Maurice Bendrix, um filósofo romancista, por quem se apaixona ardentemente. O caso de amor, apesar de proibido, é extremamente libertador para Sarah. O relacionamento se intensifica, mas de repente Sarah rompe a relação, sem explicações. Alguns anos depois, Bendrix a reencontra, ainda apaixonado, iniciando um sentimento de amor e ódio, aprofundado pelo ciúme, a ponto de colocar um detetive para segui-la. Sua obsessão passa a ser desvendar o mistério da separação e o que de fato sentiam um pelo outro.

A história aparentemente simples, apresenta um triângulo amoroso que a princípio parece clichê: marido/esposa/amante da esposa. Mas é sempre assim com o autor de “O Poder e a Glória”: tem-se a ilusão de que se vai ler algo simples e linear e, de repente, somos assombrados por tramas misteriosas e inquietantes. Não há apenas amor e infidelidade nesse "jogo", mas também ódio - caracterizado de modo peculiar -, as contradições entre fidelidade e lealdade, interesses, revelações surpreendentes e evocações singulares do passado.

Graham Greene era um católico que concebia a vida terrena como um purgatório, ou seja, um lugar de provação para que através dele o homem ganhasse a graça divina. Esse posicionamento e concepção do mundo se refletem em “Fim de Caso” através da angústia e da consciência atormentada pelas dúvidas e pelo ódio dos personagens principais - Henry e Sarah Miles, seu amante e narrador do livro, Maurice Bendrix, e de um coadjuvante marcante, Richard Smythe. São personagens ateus ou com uma fé relutante e quase atéia (sem caracterizarem-se como plenamente agnósticos) com a descrença abalada devido a uma contundente "reviravolta" na narrativa, que não convém revelar para não tirar o suspense do livro.

Bendrix vai contando seu relacionamento com Sarah em um tom amargo e confessional, como se buscasse o perdão, mas em uma atmosfera apenas autossugestiva. O amor e o ódio são expostos como faces da mesma moeda, e até se confundem na mentalidade do narrador. A existência e a natureza de Deus é alvo de sua interrogação constante. Amargurado com o afastamento de Sarah, Bendrix nega o nexo com o Mistério e os frutos inusitados que esse relacionamento suscita, como a surpreendente amizade com Henry, o marido de Sarah.

Na ânsia de descobrir porque foi abandonado por Sarah vai surgindo, para Bendrix, a face de um Outro. O descrente e ressentido narrador é obrigado a acompanhar, na sua corrida para o abismo das impossíveis reconstituições, o processo de conversão da amante, e obrigado, além disso, a encarar (aceitar já seria dizer muito) a possibilidade da existência do inaceitável: o milagre. Se alguém tiver dúvida da intensidade a que se chega nesse triângulo em que Deus é um dos vértices, basta ler a cena inacreditavelmente delicada em que Bendrix encontra, pela última vez, Sarah em uma igreja.

Ele próprio um convertido – foi batizado aos 20 e poucos anos -, assim como Sarah, Greene dizia que gostaria mais de ser conhecido como um católico que era romancista do que como um romancista católico. Aparentemente, para ele, crer era um exercício extremamente doloroso. “Peguei a crença como uma doença”, diz Sarah no livro.

Crença e dor – culpa, arrependimento, remorso, medo, tudo – vão tão juntos, que, para muitos leitores, a história de Sarah, Bendrix e Henry poderá parecer mais própria de uma pessoa que não crê. Mas para Greene, assim como em “O Poder e a Glória”, o relacionamento com o Mistério aprofunda a humanidade do homem mas não o afasta do sofrimento.

"Fim de Caso" virou filme em 1999 pelas mãos do diretor inglês Neil Jordan (que também dirigiu "Na Companhia dos Lobos", "Entrevista com o Vampiro" e "Michael Collins") cujo roteiro é bastante fiel ao livro. Estrelado pelos atores Stephen Rea, Julianne Moore e Ralph Fiennes, está disponível em DVD.

Biografia

Henry Graham Greene nasceu em 1904, na Inglaterra, mais conhecido como Graham Greene, foi escritor de romances, contos, peças teatrais e críticas literárias e de cinema. Formou-se na Universidade de Oxford, e começou sua carreira como jornalista, trabalhando como repórter e subeditor do The Times. Publicou cerca de 60 romances.
Durante a Segunda Guerra Mundial, de 1941 a 1943, trabalhou para o governo inglês no departamento de relações externas, dirigindo um escritório em Freetown, Serra Leoa. Muitos de seus romances, a partir de então, tiveram como tema ou pano de fundo a espionagem.
Seu primeiro livro de sucesso foi "O Expresso do Oriente" (1932). Outras obras: "O Poder e a Glória" (1940), "Nosso Homem em Havana" (1958) e "O Fator Humano" (1978). Muitas de suas obras foram transformadas em filmes. Suas obras falam muito de situações políticas de países pouco conhecidos e aos quais viajava frequentemente, como Cuba e Haiti. Outra temática frequente é a religião. Tendo se convertido ao catolicismo em 1926, os dilemas morais e espirituais de sua época eram representados através de suas personagens. Graham Greene era considerado o maior 'escritor católico' da Grã-Bretanha, apesar de sua resistência em ser retratado dessa maneira. Morreu em Vevey, na Suíça, em 3 de abril de 1991



Título: Fim de Caso
Autor: Graham Greene
Gênero: Literatura Estrangeira
Editora: Record / Edições BestBolso
Idioma: Português
Encadernação: Brochura
Número de Páginas: 237

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