Vai para os conteúdos

LEITURA

O mestre e Margarida

08/05/2012 - Sugestão de leitura para o bimestre.

"O Mestre e Margarida" é um romance revolucionário, onde Mikhail Bulgákov narra a fantástica chegada do diabo em plena Moscou comunista dos anos 1930. E satanás não está sozinho; em sua comitiva, há uma feiticeira nua, de "ardentes olhos fosforescentes", um homem de roupas apertadas e monóculo rachado, um gato preto de "proporções espantosas".

O livro tem traços excepcionais já na própria história; escrito e reescrito ininterruptamente durante dez anos, entre o final da década de 1920 e a morte do escritor, só pôde começar a ser publicado no final da década de 1960, depois de correr o risco de desaparecer, condenado ao esquecimento pelas mesmas razões que levaram seu autor a ser mal visto pelo sistema. Numa impressionante carta a Stalin, em março de 1930, ele se definia como um escritor “místico” e que necessitava da liberdade como os peixes precisam de água.

No texto o autor cruza três histórias com tom e colocação espaço-temporal radicalmente diferentes. O primeiro núcleo narrativo é constituído pelas aventuras de uma brigada de diabos na Moscou comunista e ateia dos anos 30. Parece que Bulgákov teve a primeira ideia do romance depois de ter assistido, pelas ruas de Moscou, dia 7 de janeiro de 1923 (dia do Natal ortodoxo), a uma estranha procissão na qual era celebrada uma nova festividade, o “Natal da Juventude Comunista”. O segundo núcleo – quase que em contraposição direta a essa violência, que não se contentava em blasfemar contra Deus, pois queria até excluí-lo da história – é justamente a história do processo de Cristo e da sua paixão contada como o relato de uma testemunha ocular excepcional, o próprio diabo. O terceiro núcleo é a narrativa do amor de Margarida pelo Mestre, um escritor que começou a escrever um romance histórico sobre esse tema e foi banido, chegando quase a enlouquecer e a queimar tudo o que havia escrito até então. Mas... graças ao amor de Margarida e à intervenção dos diabos, “os manuscritos não queimam” e, ao final de uma série de aventuras, nós temos a possibilidade de reler a história.

O tema que percorre todo o romance e o torna fascinante é justamente esse desafio para reencontrar a história, tanto o texto do romance como a realidade mesma e todo o seu mistério, desafio que só pode ser vencido por quem ouve, por quem tem a curiosidade de ver, renunciando à pretensão de saber e possuir tudo a partir de um esquema pré-definido. É o que nos é sugerido na cena de abertura do romance, quando dois intelectuais comunistas procuram convencer um estranho personagem – que ainda não sabem que é o diabo – sobre a inexistência de Deus. É uma disputa acirrada, cujo sentido é dado pela troca de golpes finais, quando um dos dois rebate o diabo, que havia acabado de lhe dar uma série de elementos racionais (filosóficos, históricos, científicos, astrológicos...) para reconhecer a existência de Deus: “Desculpe, professor, mas a respeito dessas coisas nós temos um ponto de vista diferente”; e o diabo, renunciando a todas as suas capacidades, vai ao coração da questão e conclui que “não precisamos de nenhum ponto de vista”, pois, como dirá mais adiante: “É um fato. E o fato é a coisa mais teimosa do mundo”. E assim começa a narrar a história da Paixão como uma testemunha ocular, que conta os fatos que acompanhou pessoalmente, o acontecimento do qual foi contemporâneo. E “acontecimento” em russo se diz sobytie, literalmente “estar com”.

Bulgákov levou cerca de dez anos para terminar o livro. Sabendo dos problemas que teria com a censura - chegou, inclusive, a queimar uma versão inicial. Ditou à mulher as últimas revisões semanas antes de sua morte, em março de 1940. Apenas seu círculo mais íntimo de conhecidos sabia da existência do romance e, também, da impossibilidade de lançá-lo durante o regime stalinista.

O livro sobreviveu por mais de duas décadas e, contra todas as previsões, tornou-se um fenômeno. Acabou, assim, por confirmar uma frase dita no romance pelo próprio diabo, e que na Rússia se tornou proverbial: "Manuscritos não ardem." "O Mestre e a Margarida" é, enfim, um dos livros mais importantes e cultuados do século XX.

Sobre o autor:

Mikhail Bulgákov nasceu em Kiev, em maio de 1891. Trabalhou como médico e, depois de viajar pela Rússia e pelo Cáucaso, estabeleceu-se em Moscou em 1921, onde se dedicou à carreira literária. Escreveu contos, romances e peças, entre elas "Os dias dos Turbin", que teve sucesso no Teatro de Arte de Moscou, em 1926, "A debandada", em 1927, e "Molière", encenada em 1936. Trabalhou também na adaptação para o teatro de clássicos como Almas mortas e Dom Quixote.
A veia satírica de sua obra e a sua posição cada vez mais conflitante com o regime stalinista fizeram com que fosse duramente criticado e, no final dos anos 1920, começasse a ter problemas crescentes com a censura. Morreu em 1940, algumas semanas depois de fazer as últimas revisões de seu romance mais importante - e até então inédito -, O Mestre e Margarida.


O Mestre e Margarida
Mikhail Bulgákov
Ed. Alfaguara, 2010

 
 

Credits / © Sociedade Litterae Communionis Av. Nª Sra de Copacabana 420, Sbl 208, Copacabana, Rio de Janeiro - RJ
© Fraternità di Comunione e Liberazione para os textos de Luigi Giussani e Julián Carrón

Volta ao início da página