Os anos 70 foram vitais na formação do jovem menino Marco Aur. Naquele tempo, Minas era a sua casa, o seu terreiro, a sua cidade. O que tinha de mais valioso era a família, os amigos, a pracinha, a escola... a vida sendo vivida ali, comungada, cooperativa, comunitária, solidária. A cidade era de todos e todos cuidavam dela. Havia um centro porém, um ponto de apoio e unidade, e esse era simbolicamente o sino da igreja. Era ele quem comunicava lá do alto o passar das horas, os avisos póstumos, os toques fúnebres da semana santa, as alegrias da vitória de Jesus Cristo ressuscitado e todas as festas e convites para todo mundo.
Nesse ambiente cresceu Aur, filho de pais católicos que de forma simples ofereceram ao menino aqueles valores. Hoje, vivendo em outro mundo, em outro tempo, em que claramente caminhamos para uma vida mais complexa, mais apressada, mais isolada e porque não dizer menos solidária, valores como aqueles da cidade pequena, da comunidade, da família precisam ser lembrados. De fato, para nossa surpresa, a igreja continua sendo um dos grandes núcleos geradores de humanidade que ainda possuímos. Mas, onde estão as crianças que na década de 70 enchiam as missas e participavam cantando, concelebrando, colorindo o domingo com sua alegria, suas cores, seu protagonismo? Pois é, estão mudas.
Por conta dessa e de tantas outras perguntas, Marco Aur arregaçou as mangas e começou a preparar o CD “A missa dos meninos”. Um CD com canções para uma missa completa com todos os momentos que precisam ser cantados. É um convite para os pais e para reconduzirmos os jovens e crianças pro colo de Jesus fazendo dessa celebração um momento vivo e cheio de vozes e melodias. Um CD pensado pra que eles possam, de forma delicada e com muito bom gosto, sacarem seus violões, seus tambores e sobretudo suas vozes.
Esse CD, único no Brasil, chega em boa hora. Além das faixas do percurso tradicional da missa, o CD oferece três bônus: uma canção a Maria, uma a São Francisco e ainda um tributo a Alan Kurdi, menino refugiado Sírio encontrado morto numa praia turca em 2015. A seguir, breve bate papo com o artista.
Como a infância te inspira?
Marco: Eu não me inspiro na infância. Por algum motivo eu não perdi o elo, o fio que me leva a dialogar e a entender a infância. Talvez meu trabalho tenha me favorecido, mas acho que também existe um interesse natural, genuíno pelas crianças. Mas cuidado, antes de me julgar (risos), não me sinto criança, não brinco de ser criança. Simplesmente tenho muitas razões para me aproximar delas e por isso também, de mim mesmo. Por alguma razão me compreendo melhor quando me volto para a infância. Nesse sentido, a infância me inspira como um elemento desta minha historia que está acontecendo agora.
Como você imaginou esse CD “A missa dos meninos”?
Marco: Tenho visto aqui na paróquia do meu bairro, em Belo Horizonte, que as pessoas gostam muito de cantar. Gostam mesmo! Cantam todas as partes da missa, isso chega até a me incomodar um pouco. Mas isso me chamou muita a atenção. Certo dia, durante um desses cantos, me veio a ideia de fazer um CD especialmente para as crianças cantarem. Hoje em dia as crianças não protagonizam mais as missas. Eu me lembro de como eram especiais as coroações, as procissões, a gente ajudava o padre, éramos coroinhas, levávamos as ofertas, tínhamos um papel dentro daquela comunidade. A nossa presença marcava aquele ambiente religioso que com nossas presenças ficava ainda mais bonito e cheio de graça. Isso nos formava também, teve um valor de formação pessoal pra todos nós. Mas foi assim, depois da missa, fui pra casa e passei a noite escrevendo as letras e fazendo as canções. Depois ainda fiz algumas pesquisas pela tradição musical da Igreja. Sou muito cuidadoso e tenho também lá minhas reservas com relação à música dentro do rito religioso. Sou “filho” do Virgílio Resi [padre italiano de CL, falecido em 2002] e por isso sinto uma responsabilidade muito grande com isso. Tenho um compromisso moral com a qualidade do meu fazer artístico. Tive a chance de conhecer o canto gregoriano e os cantos da tradição da igreja através da amizade com ele, por isso acho que tenho algumas credenciais para tocar neste assunto. Também percebo o incômodo de muito amigos, padres e pessoas com as quais me relaciono, sobre esse assunto da música dentro da igreja. As pessoas abusam dos nossos ouvidos, não é mesmo? Mas é isso, a música é um dilema grande, e vejo como estamos perdidos. Não sabemos julgar sua adequação dentro dos ritos e por isso muitas vezes ficamos nas mãos do senso comum: músicas sentimentais demais ou músicas de animação. Nesse CD eu canto menos, deixo os meninos cantarem. Gostaria até que eles tocassem também nas gravações, mas isso tornaria os custos de produção muito caros. De qualquer forma, a base dos arranjos foi pensada nos violões, tornando-o muito acessível para quem está começando a gostar de tocar. No encarte virão as cifras, o que vai ajudar também. Espero que as pessoas que tiverem a chance de ouvi-lo possam curtir as músicas mesmo em casa ou no carro. Está saindo pela gravadora Kuarup que assina as minhas produções. Eu me sinto realmente honrado de poder trabalhar e ter o suporte de uma gravadora desse porte. Não é fácil ser artista autoral nesse nosso tempo.
EM TEMPO: O CD está sendo mixado e masterizado e a previsão é de lançamento ainda este ano.
Acompanhe o trabalhe de Marco pelo site: www.marcoaur.com.br
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Fotos de Kika Antunes.
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