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CARIDADE EM AÇÃO

Fundação Maddalena Grassi. Maior que a doença

por Paolo Perego
02/03/2016 - Artigo publicado em Passos 103 (abril/2009). No início, a assistência domiciliar. Depois, a acolhida aos doentes de AIDS e deficientes. Uma obra que, graças a uma amizade, e a um método, cresceu no decorrer dos anos

Um brioche no domingo de manhã. Dona Adriana está na cama, doente, não pode se mover. E a enfermeira nunca se esquece de levar-lhe brioche: antes de chegar à sua casa, uma parada na padaria é habitual. Um pensamento banal, talvez. Mas, para a anciã sozinha, este gesto é tudo, menos insignificante. É um olhar humano sobre si, um sinal de afeto e de atenção totalmente gratuito. Algo que vai além do mero “cumprimento de um serviço”, como na verdade poderia se reduzir a assistência médica domiciliar: no fundo, seria suficiente uma consulta e um medicamento... “Dar ‘algo a mais’ é o que sempre dizemos entre nós. E, sobretudo ultimamente, em vista da grande solidão que encontramos passando pela casa das pessoas.” Quem fala é Catia Tognoni, coordenadora da atividade principal da Fundação Maddalena Grassi: assistência médica domiciliar. Cerca de oitenta pessoas trabalham todos os dias pelos bairros de Milão, com um total de cerca de 450 visitas cotidianas. E mais de 600 pacientes assistidos em suas casas, muitos dos quais, terminais.
A Fundação Maddalena Grassi nasceu nos primeiros anos da década de 90 para atender à demanda crescente de trabalhadores que prestassem serviço no domicílio do doente. Uma história feita de providência e de encontros, que permitiram à Fundação alargar, no decorrer dos anos, seu campo de ação, para além da assistência domiciliar. Porém, sem nunca perder de vista a sua origem.
Foi assim que chegaram à casa de acolhida para doentes de AIDS de Seveso e à casa de Vigevano, na região de Pavese, esta última nascida dentro da Fundação e em funcionamento desde 2005. Para entender melhor do que estamos falando, partamos exatamente daqui, do último capítulo. De Vigevano, especificamente.

FATOS QUE MUDAM. Uma casa antiga, com três andares e um grande jardim. Em cada andar, um departamento diferente. No térreo, o centro diurno para doentes mentais: chegam pela manhã com um ônibus e ficam até o meio da tarde. No mezanino, oficinas de pintura, educação alimentar, ginástica. No primeiro andar, a residência permanente, para os psiquiatras. No total, vinte vagas para o tratamento diurno. E vinte para a acolhida como residência. Massimo Croci, anestesista, hoje é o diretor de saúde da Maddalena Grassi de Vigevano: “Foi o casal Rondo, uma família da região, doentes e assistidos até o fim por nós, que nos pediram para ‘fazer algo de bom’ com sua doação. Era o ano 2000 e, cinco anos depois, abrimos as portas”. Nos corredores, os hóspedes nos olham de cima em baixo, curiosos por saber quem são os estranhos que, no fundo, andam por sua casa: “Exato, é a casa deles, pois muitos não têm mais uma casa, ou não estão em condições de tê-la”, diz Massimo. A coisa mais importante para poder estar diante desses doentes? A concepção que quem cuida deve ter uma pessoa por quem é cuidado: “Antes de tudo, são seres humanos. Isso muda tudo”. No segundo andar funciona o centro de acolhida para deficientes “Marco Teggia”. Dezoito leitos, seis pessoas em estado vegetativo, distrofias, escleroses laterais amiotróficas, Síndrome de Huntigton... Aqui, não é possível curar, evidentemente. “Mas alguns melhoram: no quarto estão duas jovens que estavam em estado vegetativo. A uma já conseguimos interromper a alimentação com a sonda e agora a ajudamos a comer dando-lhe comida na boca. Ainda não fala, embora sua mãe tenha dito que telefonou para ela. Enquanto a outra, está fazendo pequenos progressos... ‘Bom dia, como estamos hoje?’. ‘Bem, doutor’.”
Fatos que mudam as cartas na mesa. Para as instituições, uma melhora gera aumento nos custos de manutenção. Uma pessoa em estado vegetativo custa menos do que alguém que saiu dele. Além disso, levam em consideração muitos protocolos médico-científicos: em 1994, ficou estabelecido que, em termos precisos, os estados vegetativos só poderiam se recuperar se apresentassem melhora num prazo de 3 a 6 meses. Em Vigevano, aconteceu algo bem diferente em ambos os casos. Com uma média de recuperação de dois entre onze pacientes que passaram por aqueles quartos. “As variáveis em jogo são muitas. Mas, certamente, uma é fundamental. São cerca de 50 profissionais que trabalham aqui e que mudam sua forma de trabalhar estando com esses pacientes, aprendendo a perceber qualquer mínima reação ou tensão do rosto. Trata-se de uma relação biunívoca. Os enfermeiros crescem, aprendem e os pacientes, por sua vez, melhoram.” E, assim, chega-se até a fazer novas descobertas em campos em que a medicina ainda oferece poucas explicações: “É a experiência que as dita. Tomemos como exemplo André, que chegou aqui em estado vegetativo. Seguia com os olhos o relógio de uma enfermeira. Descobrimos que era igual ao que tinha dado de presente à sua mulher anos antes”. Nos corredores, chega uma mulher de cabelos loiros. Passa e sorri. Entra no quarto de André. Basta olhá-lo da porta, uma saudação, e sua boca se escancara, enquanto o corpo permanece rígido e contorcido. A mão dela se estende para uma carícia. Estado vegetativo.

A TIA DE MADDALENA. “Aqui está o princípio da nossa Fundação. Assistir é o primeiro cuidado”, explica Luciano Riboldi, diretor da Clínica do Trabalho do Hospital Maggiore de Milão e presidente da Maddalena Grassi. Na mesa da sala de reunião da sede, no centro de Milão, estão reunidos com Riboldi alguns dos fundadores da Fundação. “Na verdade, não inventamos nada. Já fazíamos assistência domiciliar. Começou como caritativa, porém, os pedidos de assistência domiciliar aumentavam. E nós sentíamos a necessidade de que o nosso trabalho, já tão pleno e humano, pudesse se estruturar cada vez mais em uma resposta orgânica.” Faltava apenas a ocasião para começar. “Encontramos Matilde Grassi. Era tia de Maddalena, uma jovem de 19 anos morta pouco tempo antes por causa de uma doença congênita, daquelas em que a sobrevivência depende da assistência. A tia colocou à disposição o dinheiro para começar uma obra de assistência aos doentes. E, em 1992, nasceu a Fundação”, conta Maurizio Marzegalli, diretor do departamento de Urgências Emergenciais do Hospital San Carlo de Milão.
À mesa, também está Alessandro Pirola, diretor administrativo da clínica Columbus de Milão, nascida do ímpeto missionário de Santa Francesca Cabrini: “Éramos ‘apenas’ médicos, como poderíamos administrar uma Fundação? Era preciso fazer as coisas burocráticas, entre elas o relacionamento com a ASL (Azienda Sanitaria Locale; nde), com a Sub-prefeitura, documentos públicos. Apresentaram-nos Alessandro como alguém que poderia nos ajudar. Foi assim que tudo começou. E nasceu uma grande amizade, que é a origem da nossa experiência e continuamente a sustenta, porque é o método do nosso agir”, explica Riboldi, apresentando-o a nós. Não fizeram nenhum projeto, mas muitas flores brotaram inesperadamente, como explica Marco Botturi, vice-presidente da Fundação: “Os encontros destes anos ditaram o caminho. O método? Reconhecer aquilo que existe e que pede resposta”.
Como aconteceu em Seveso, cidade vizinha a Milão. Em 1994, a Fundação abriu uma casa na periferia da cidade – doação de uma família que, por sua vez, prestara esse serviço durante anos –, um hospício para acolher doentes de AIDS. “Eram os anos da explosão da doença”, lembra Riboldi. Naquela época, os doentes morriam rapidamente. E aqui, morreram mais de 160 em quase 15 anos. “Hoje, com as novas terapias, as expectativas de vida aumentaram: 10 anos ou até mais. Alguns chegam a 20.” Sara, coordenadora da casa, explica: 12 hóspedes para 7 trabalhadores. “Isso permite uma certa atividade com os doentes, não que sejam apenas acompanhados até a morte. Por isso, Seveso se torna a casa deles, sua família.” Como para Angelo, de setenta anos. Chegou em Seveso depois de ter perdido tudo. Depois, se recuperou. Comprou um apartamento perto dali. E hoje, volta à casa todos os dias. Para cuidar da horta e do jardim da “sua casa”, para estender as roupas da “sua família”.

MACARRONADA PARA OS DOENTES. Mas não só em Seveso existem doentes de AIDS: “Temos 60 que são acompanhados em suas casas por uma dezena de assistentes domiciliares. Não se trata apenas de assistência médica. Mas de ajudá-los a arrumar a casa, fazer compras e, às vezes, apenas lhes fazer companhia”, conta ainda Catia Tognoni. “Há algo em comum em todos os assistidos em domicílio: a necessidade que encontramos não é apenas de uma consulta. Mas de um sorriso, uma palavra. Muitas vezes, pensa-se que ser profissional é executar algumas tarefas particulares. Mas, aquele ‘dar a mais’ faz parte da profissão plenamente. Aliás, faz com que ela cresça, porque muitas vezes aprendemos com quem temos diante de nós ou com aquilo que acontece. Tem que ver com o humano, e é essa exatamente a beleza desse trabalho.”
“A experiência que fizemos nesses anos, as coisas que vimos nos fizeram entender que existem sofrimentos que não podem ser cuidados apenas com remédios. Pensamos em quem está sozinho, ou que perdeu tudo. Entender isso permitiu olhar porque o paciente sofre mesmo sem sentir dor”, diz Angelo Mainini, diretor de saúde da Fundação. “É realismo – precisa Pirola –. Porque só o realismo, isto é, estar diante dessas pessoas porque existem, assim como são, torna possível fazer aquilo que fazemos. Senão... Mas, onde podemos encontrar doentes terminais de AIDS sentados fazendo festa, saboreando um prato de macarronada preparado por uma assistente? No entanto, acontece. Em nossa casa de acolhida em Seveso, acontece.”

Site da Fundação: http://www.fondazionegrassi.it/

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